O que é uma marca empregadora e por que as empresas precisam se preocupar com isso?
Muitas empresas acham que para atrair um bom profissional é só colocar um anúncio bonito nas redes. É muito mais do que isso. Uma “marca empregadora” é como você se posiciona para o seu colaborador e para aqueles que você gostaria de atrair, expressando seus valores e a sua cultura organizacional. Uma boa “marca empregadora” — com seus modelos de liderança, política salarial, oportunidades de crescimento etc — é o que vai tornar a empresa um local onde as pessoas desejam trabalhar, colaborar e contribuir.
O que os profissionais esperam das empresas hoje quando se candidatam para uma vaga?
Hoje os candidatos, do jovem ao mais sênior, não confiam no que a empresa fala a respeito dela no site ou Linkedin. E aqueles que estão interessados em fazer carreira querem de fato saber como é a política da empresa em relação ao meio ambiente, à questão social e a diversidade. Isso é verdadeiramente levado em consideração na tomada de decisão para escolher a empresa onde se vai trabalhar.
As marcas precisam aprender a comunicar seus valores e a ser transparente. Claro que a empresa não vai querer falar coisas sobre as quais não gostaria que as pessoas soubessem. Mas uma boa marca empregadora fala o que ela tem de positivo e quais são os desafios que ela está enfrentando e por isso ela precisa de um profissional com determinado perfil. Quando eu conto os abacaxis que tenho para descascar, a pessoa vai dizer, eu quero isso pra mim – ou não. O pior é um profissional sentir que foi enganado durante a seleção e ver que não era nada daquilo.
Marcas que têm produtos desejados são as empresas mais desejadas para se trabalhar?
Não necessariamente. Posso ter um excelente produto e ter uma cultura mais agressiva. Uma pessoa que não gosta de ambiente de alta pressão, não vai se adaptar àquela cultura. Tem gente que gosta de ambiente mais competitivo e outros que odeiam. Aí entra a questão do “employer branding”. Como exteriorizar que esse produto maravilhoso é resultado de um ambiente com determinados valores e culturas.
Empresas com culturas super agressivas, com muita cobrança, podem ser boas marcas empregadoras? Ou é uma questão de achar o perfil correto?
A alta performance faz parte do jogo. O erro é se a empresa cobra alta performance mas não ajuda a preparar as pessoas. Um profissional que entrega resultado a qualquer custo, passando por cima das pessoas, que altera produto para manter margem, mesmo perdendo na qualidade da matéria-prima, não vai conseguir trabalhar em uma empresa onde a qualidade está acima de tudo, como Nestlé, Unilever ou Ambev. Esse ponto é importante.
Empresa que só quer lucro e não importa se entrega o melhor produto ou serviço, tem que buscar quem valoriza isso. Tem que saber qual é a sua cultura para contratar direito, expressando a realidade do dia a dia. Não adianta avaliar só o perfil técnico, tem que trazer pessoas aderentes à forma de pensar e aos objetivos da organização.
No passado, a “marca empregadora” Ambev viveu uma enorme crise justamente por conta de uma cultura extremamente agressiva e teve dificuldade para atrair jovens para seu programa de trainee.
Aquele formato deu certo por muito tempo, mas se tornou insustentável. O mundo mudou. O que as pessoas, sobretudo os jovens, querem para suas carreiras mudou. O próprio negócio da cerveja precisou ser reinventado. O consumidor hoje quer uma empresa sustentável. E a Ambev teve que se adaptar. Foram feitas reflexões muito profundas e a arrogância de uma empresa que tinha todas as respostas, que sabia tudo, deu lugar a ‘uma empresa que aprende todo dia’ e se reinventa o tempo inteiro.
Na época, foi muito discutido se a palavra meritocracia deveria ser mantida como um valor da companhia. Eles avançaram muito nesse ponto, mantiveram, mas ressignificaram o que é ter um ambiente meritocrático. E quando você muda algo tão intrínseco, você tem que apoiar alguns líderes a entender o novo formato. E outros vão precisar ser substituídos. Houve implementações muito bonitas. A Ambev foi a primeira empresa a abrir uma diretoria de saúde mental na pandemia.
A pandemia acabou, mas as empresas e colaboradores ainda não se entenderam sobre o modelo ideal de trabalho. Como manter a cultura com trabalhadores em home office?
Cultura você expressa no dia a dia, na relação com as pessoas. Não tem a ver com estar perto ou longe. A cobrança, a exigência, é a mesma. Na Cia de Talentos, nunca foi importante a presença do colaborador. O compromisso é com a entrega e a qualidade da entrega.
Hoje temos no escritório um centro de convivência. Quem quer ir, vai e trabalha de lá. Cada time tem o seu combinado. Mas quando as pessoas vão para o presencial, tem que incluir um café, um almoço ou happy hour para socialização. Não é pra ficar só na frente do computador. Acho importante também ter rituais.
Nós fazemos quatro encontros por ano. No último, fizemos clínicas de beach tennis. Esses momentos ajudam a manter a cultura. Temos uma reunião mensal com todo o time, onde apresentamos resultados, erros e acertos. Cada empresa tem que encontrar seu jeito de ser. Ninguém quer voltar 100% para o presencial. Se a empresa quiser impor isso, tem que estar ciente de que poderá perder bons talentos.
Diante da resistência de muitos trabalhadores, contratar para o modo presencial pode ficar mais caro?
Aqui no Brasil a gente tem vale transporte, vale alimentação. Não acho que seja justo com quem já está na empresa pagar mais para os novos colaboradores. Acredito que se uma pessoa não se sente atraída para trabalhar em uma empresa onde o presencial é mandatório, não vai ser dinheiro que vai fazê-la ficar feliz tendo que trabalhar se deslocando. O profissional que quer ficar todo dia em casa, ele não vai ser feliz em uma empresa em que o traço cultural é o comando e controle, em que a liderança quer o profissional presente. Então essa pessoa não vai se adaptar. É a cultura da empresa, adequada ao perfil do profissional, que vai ajudar a levar o colaborador para o trabalho presencial.
Fonte: O Globo.