O país mal se recupera da segunda onda da COVID-19 e especialistas já tentam observar o horizonte em busca de sinais que indiquem uma terceira e torcendo para que ela não seja um tsunami que bata na costa brasileira com força arrasadora entre junho ou julho. Enquanto isso, o tempo é de aprender com as tormentas anteriores e se preparar para uma nova, caso chegue.
Com essa perspectiva, infectologistas e secretarias de Saúde, além de outros médicos, deram suas as previsões e preparativos para eventual nova disparada da pandemia.
Embora as situações variem muito entre cidades, é possível observar uma tendência: enquanto a demanda de pacientes experimenta recuo – embora siga altíssima –, gestores tentam aproveitar o alívio para evitar o fechamento de leitos, buscam fazer estoques do chamado kit intubação, mas enfrentam dificuldade para isso, e procuram soluções que afastem seus hospitais do pesadelo da falta de oxigênio.
No entanto, o potencial para ampliação de vagas, especialmente de UTI, parece ter chegado perigosamente perto do limite – por capacidade física, e, principalmente, por falta de pessoal especializado. Paralelamente, a incerteza sobre a intensidade de possível nova alta de casos preocupa todos e o surgimento de novas variantes do coronavírus, em cenário de vacinação lenta, tira o sono de autoridades sanitárias.
Nesse ambiente, há quem alerte: as condições para outro repique de contágios continuam presentes, o sistema hospitalar segue próximo ao esgotamento, a queda do isolamento é uma ameaça visível em todas as ruas e a probabilidade de um colapso tão grave quanto em março e abril é real. E, para esse extremo, ninguém está, verdadeiramente, preparado.
Risco de repetição do colapso na saúde
Redes pública e particular de saúde em Belo Horizonte apostam que a capacidade já instalada para atender à segunda onda da COVID-19 dê conta da demanda de uma eventual terceira aceleração. No entanto, uma combinação de fatores faz com que não se tenha a dimensão exata do que pode estar por vir, tornando impossível avaliar se a estrutura é realmente suficiente.
O infectologista Carlos Starling, que integra o Comitê de Enfrentamento à COVID-19 da Prefeitura de Belo Horizonte, alerta que essa nova onda pode encontrar a sociedade desprevenida. “Se continuarmos com a atual velocidade de vacinação e com a flexibilização da mobilidade social, com certeza essa terceira onda vai acontecer. E, muito provavelmente, mais cedo do que as pessoas imaginam.”
Ele lembra ainda da chegada de uma terceira variante, a indiana. “Estamos vendo o que ela vem causando na Índia. Nossas condições estruturais não mudaram”, diz. O especialista avalia que, se não houver uma mudança na postura de gestão da pandemia em nível federal, o Brasil terá não apenas a terceira, mas quarta, quinta ondas sem conseguir controlar a doença.
“O cenário que vimos em março e abril, quando tivemos problemas de falta de medicamento para intubação, algumas cidades sem oxigênio, ainda pode se repetir no Brasil”, alerta o infectologista Unaí Tupinambás, que também integra o comitê de especialistas para enfrentamento à COVID-19 na capital.
A taxa de incidência no Brasil ainda está muito alta, com algo em torno de 60 mil casos diários. Soma-se a isso a flexibilização que teve início no fim de abril e a circulação de variantes mais infectantes. “A população está cansada, estressada. Esse cansaço pandêmico e a falta de política nacional orientando o isolamento social e o distanciamento físico, somados à lentidão da vacinação, são ingredientes que nos deixam preocupados
Monitoramento para tentar suprir demanda
A Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig) abriu chamamento para o preenchimento de vagas emergenciais e temporárias para médicos que atuarão em leitos destinados a pacientes com sintomas de COVID-19. Estão abertos seis postos para o Hospital Regional João Penido, em Juiz de Fora, na Zona da Mata, e outros 10 para o Hospital Júlia Kubitschek, em Belo Horizonte.
Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais informou que vem investindo na abertura e ampliação de leitos clínicos, de suporte ventilatório e de UTI em todo o estado desde o começo da crise sanitária. Em fevereiro de 2020, no início da pandemia, o estado contava com 2.072 leitos de UTI, total que foi ampliado para 4.796.
Disse ainda que enviou, no último dia 13, 103.030 unidades de fentanil e cisatracúrio para atender a 116 unidades hospitalares, que se encontram em níveis considerados críticos, em 84 cidades do estado. “Com relação ao oxigênio, a SES-MG informa que a qualificação da distribuição de gases medicinais, por meio da substituição de cilindros por tanques de oxigênio, foi uma das medidas tomadas para evitar a falta desse insumo nas unidades hospitalares.”
Rede privada
A rede hospitalar também tenta se preparar para eventual recrudescimento da pandemia. A Unimed-BH informou que foram criados 350 leitos durante a segunda onda da COVID-19, que continuam disponíveis, apesar da ligeira melhora no quadro epidemiológico. A rede inaugurou em abril um pronto-atendimento na unidade da Avenida Pedro I, aumentando a oferta de serviços para o Vetor Norte da capital, além de contratar, no mês passado, 650 profissionais para reforçar a assistência.
Reforços e preparações se repetem em hospitais como o Vera Cruz, no Barro Preto, Centro-Sul de BH. “A possibilidade de uma terceira onda é real, mas esperamos que seja menor do que a segunda, já que mais pessoas estarão vacinadas e já temos muitos que ficaram doentes e possivelmente estão imunizadas”, afirma Rogério Sad, médico intensivista e coordenador do centro de terapia intensiva.
Ele lembra que, desde o início da pandemia, a unidade investe na manutenção de estrutura necessária para atender pacientes com COVID-19.
No entanto, pontua que o CTI tem alta taxa de ocupação. “Como todos os hospitais, tivemos dificuldade de compra de alguns medicamentos e insumos, mas continuamos tentando e comprando, para que quando for necessário não haja falta. Do ponto de vista de recursos humanos, nossos quadros estão quase completos para o número de leitos que temos”, afirma.
Estado de Minas.