Em quase uma década responsável pela BR-040, entre Juiz de Fora, na Zona da Mata e, Brasília (DF), a Invepar Via 040 deixou de fazer uma série de benfeitorias prometidas em contrato. Desde 2017, quando começou a tentar a devolução amigável da rodovia, a concessionária mantém apenas as obras de manutenção da pista e os serviços essenciais, apesar de ter o pedágio mantido. Nesse intervalo, a empresa teve 975 Termos de Registro de Ocorrência (TRO) lavrados em função do descumprimento de regras, segundo dados levantados pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT) para a reportagem. Esses documentos geraram 133 Autos de Infração (AI), que resultaram em R$ 4,2 milhões em multas. A concessionária pagou apenas R$ 156 mil desse montante, ou 3,6% do total.
Dados da ANTT apontam que, entre janeiro de 2019 e outubro de 2020, foram registradas 150 ocorrências e 40 autos de infração contra a concessionária, por irregularidades previstas no Programa de Exploração da Rodovia (PER). Já entre novembro de 2020 e julho de 2023, período em que vigoraram os termos aditivos do processo de relicitação, foram emitidas 825 ocorrências e 93 infrações. As infrações foram submetidas a trâmite interno e processo de defesa prévia, que resultaram na conversão de 13 multas, das quais duas foram anexadas apenas como advertência e seis estão Suspensas por Decisões Judiciais (SDJ). Do total, apenas cinco tiveram valores fixados, sendo que apenas uma delas foi paga, enquanto as demais estão como dívida ativa.
O baixo valor pago em multas por irregularidades foi registrado pela falta de melhorias efetuadas durante a concessão da rodovia, prometidas em contrato. Sob gestão da Via 040 há quase uma década, a rodovia será devolvida ao governo federal com apenas 78 km duplicados, dos 557,2 km previstos em contrato, ou seja, 14% do prometido. Além disso, foram instaladas cinco passarelas das 50 pactuadas no edital (veja lista completa abaixo). Em contrapartida a promessa de construção de 11 praças de pedágio foi cumprida logo nos primeiros meses.
Entenda
A Invepar venceu o leilão de concessão da BR-040, entre Juiz de Fora, na Zona da Mata, e Brasília (DF), com a melhor oferta (melhor deságio e menor pedágio) em 2013. A empresa assumiu o controle de 936,8 quilômetros de rodovia em 22 de abril de 2014, com contrato previsto de 30 anos. A promessa era de obras de melhorias e extensão da capacidade em 714,5 km, sendo a duplicação em 557,2 km e a implantação de 50 passarelas, sendo 41 previstas para serem instaladas logo nos primeiros cinco anos da concessão. Para isso, seriam investidos R$ 8,1 bilhões no sistema rodoviário logo nos anos iniciais de contrato. Em contrapartida, o acordo permitia a construção de onze praças de pedágio, que só poderiam cobrar taxas após a conclusão de 10% das obras de duplicação.
A cobrança foi iniciada em 2015 após a empresa entregar a duplicação de 56,3 quilômetros da rodovia, além de obras de melhorias na pavimentação e sinalização da via. Porém, desde o início do pedágio, apenas 21,7 km foram duplicados, totalizando 78 km – 14% das intervenções previstas em contrato. Dos trechos que receberam as obras, apenas 12 km estão em Minas. As intervenções ocorreram em João Pinheiro, na região Noroeste. Além disso, apenas cinco passarelas foram instaladas, sendo três em Minas.
Em meio aos pequenos investimentos na rodovia em relação ao que fora inicialmente pactuado, a Via 040 protocolou, em setembro de 2017, pedido de adesão ao processo de devolução “amigável” da rodovia para que ela fosse relicitada. À época, a concessionária alegou que o cenário de crise econômica havia afetado o planejamento de arrecadação. As negociações se arrastaram por três anos, até que o termo aditivo ao contrato de concessão, acordado entre Via 040 e ANTT, foi assinado em novembro de 2020 – prorrogado por mais 18 meses em 2022. Meses depois a empresa admitiu investimento de R$ 1,9 bilhão até dezembro de 2020. Ou seja, em seis anos, ela teria investido pouco menos de quatro vezes o valor estimado em estudos de viabilidade da concessão com cifras de 2012.
O fim da privatização da BR-040 está previsto para a próxima sexta-feira (18 de agosto), quando a rodovia volta a ser de responsabilidade do governo federal. No entanto, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) afirma que o prazo para o fim da operação da concessionária pode ser estendido por mais seis meses. O assunto é discutido entre a diretoria da Agência, o Ministério dos Transportes e o Tribunal de Contas da União (TCU).
Nova concessão
Em meio ao fim da privatização pela Via 040, o projeto para a nova concessão da BR-040 segue sendo discutido pela ANTT. Entre as principais mudanças, o estudo prevê a divisão da rodovia em três trechos e a inclusão do perímetro entre Juiz de Fora e Rio de Janeiro.
Segundo a ANTT, os 1.179 km da 040, entre Brasília e Rio de janeiro, serão divididos em três partes: 315 km entre Brasília (DF) e Cristalina (GO), 595 kmk entre Cristalina (GO) e Belo Horizonte (MG) e 495 km entre Belo Horizonte (MG) e Rio de Janeiro (RJ).
Em Minas, o processo de licitação da parte da 040 entre Cristalina (GO) e Belo Horizonte (MG) já está na fase das audiências públicas. Já o trecho da BR-040 entre a capital mineira (MG) e o Rio de Janeiro está com processo mais avançado. De acordo com a Agência, o acórdão sobre o projeto foi publicado pelo TCU em maio. O próximo passo é enviar a documentação para o Ministério dos Transportes. A pasta vai definir os prazos para publicação do edital, com previsão inicial no segundo semestre.
Em nota, a ANTT disse que a definição do poder público sobre a administração da BR-040, entre Juiz de Fora/MG e Brasília/DF, ainda está em tratativa. Atualmente, está em vigor o Termo Aditivo ao Contrato de Concessão da Via 040, com vencimento em agosto. Legalmente, a Agência pode estender o prazo de operação da concessionária para prestação de serviços essenciais por mais seis meses. No entanto, a solução para o assunto segue em discussão entre a diretoria da Agência, o Ministério dos Transportes e o Tribunal de Contas da União (TCU).
Já o TCU disse que acompanha a relicitação da BR-040/DF/GO/MG. Em abril de 2023, ao analisar esse processo, o TCU fez determinações à ANTT relacionadas às ações e aos procedimentos relativos ao encerramento do contrato de concessão. O TCU não fez qualquer determinação ou aplicou sanção diretamente à concessionária na ocasião. Em seguida, foi apresentado recurso em relação a essa decisão, que foi analisado no dia 26 de julho e deu origem ao Acórdão 1547/2023 – Plenário. O cumprimento, pela ANTT, desses acórdãos será monitorado pelo Tribunal.
A reportagem procurou a Invepar Via 040 sobre as multas, mas não obteve retorno. Tão logo a empresa se manifeste, a matéria será atualizada.
Veja o que foi prometido e o que foi feito durante privatização da BR-040.
Conforme a ANTT, no edital para a concessão da BR-040, publicado em novembro de 2013, foram definidas as seguintes melhorias físicas e operacionais que deveriam ser realizadas durante o contrato de 30 anos:
- O trecho concedido deveria ser totalmente duplicado até o final do 5º ano do prazo da Concessão. Ao todo, 557,2 km de pistas deveriam ser ampliados.
- Construção de onze praças de pedágios, sendo 10 em Minas e uma em Goiás. A cobrança da Tarifa de Pedágio, no entanto, só poderia ter início, simultaneamente em todas as praças de pedágio, após a conclusão dos Trabalhos Iniciais no sistema rodoviário, a execução de 10% das obras de duplicação.
- Implantação de 59 interseções, com os mesmos prazos e percentuais definidos para as obras de duplicação, além de outras 11 a serem implantadas a partir do 61º mês da concessão;
- Implantação de 41 passarelas, com prazos e percentuais definidos para as obras de duplicação, além de outras 9 a partir do 61º mês da concessão;
- Implantação de 56 melhorias em acesso, com os mesmos prazos e percentuais definidos para as obras de duplicação, além de outras 12 a serem implantadas a partir do 61º mês da concessão;
- Implantação de 148,2 km de vias marginais em travessias urbanas, segundo extensões definidas no PER para cada subtrecho do sistema rodoviário, e com prazos e percentuais defasados de um ano em relação aos definidos para as obras de duplicação, além de outros 10 km a serem implantados a partir do 61º mês da concessão.
Dados da ANTT, no entanto, apontam que, passados quase dez anos desde a concessão, apenas 14% das duplicações foram efetuadas. Veja as melhorias concluídas:
- Obras para duplicação da rodovia – 78 km
- Instalação de passarelas – 5
- Construção de retorno em Nível – 3
- Construção de viaduto – 1
- Construção de Base de Serviços Operacionais – 18
- Construção de praças de pedágio – 11
A reportagem procurou a Via 040 sobre o número de obras realizadas no período da concessão. Segundo balanço, a empresa investiu em “inúmeras obras e serviços”. Veja as melhorias, conforme a Via 040.
- Construção de 21 postos de atendimento ao usuário;
- Construção de um centro de controle operacional;
- Reforma de três postos de pesagem de veículos pesados;
- Melhorias de asfalto em 1.800 quilômetros de pistas;
- Reforma de 171 pontes e viadutos;
- Instalação de mais de 26 mil placas novas de sinalização;
- Instalação de mais de 600 mil tachas refletivas (olhos de gato) na pista;
- Pintura de 13 mil quilômetros de pintura de sinalização;
- Instalação de 195 mil metros de defensas metálicas;
- Recuperação de 46 mil metros em sistemas de drenagem;
- Capina em 45 mil quilômetros de canteiros centrais, margens e trevos, o equivalente a 19 mil campos de futebol;
- Atendimento a mais de 520 mil usuários em auxílios diversos, como pane mecânica, bateria descarregada, pane seca, pneu furado e remoções de veículos para locais seguros;
- 74 mil atendimentos médicos, incluindo o parto de 26 bebês realizados na rodovia.
Fonte: O Tempo.