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Mulheres não são sub-representadas, mas excluídas da política

Por Dentro De Tudo:

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Dos 853 municípios mineiros, 22% não tem sequer uma vereadora e 39% têm apenas uma. E o Estado tem somente uma prefeita negra, em São Gotardo (Triângulo). No Brasil, 978 municípios não têm essa representação feminina nas câmaras e 3.185 não têm vereadora negra. Nas prefeituras brasileiras, 88% dos titulares são homens.

Os dados levam as participantes do Ciclo de Debates: Precisamos falar sobre a (in)visibilidade das mulheres a classificar o quadro não como sub-representação, mas como exclusão política de gênero. O evento integra o Sempre Vivas 2024 e foi realizado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta terça-feira (5/3/24).

“Essa exclusão é multiderminada, mas pode ser resumida assim: homens brancos cis dominam o jogo político e mantêm seu privilégio de poder”, aponta Marlise Matos, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem-UFMG). Ela participou da mesa intitulada “Sub-representação das mulheres na política e seus impactos na democracia”.

Para a professora, a paridade de gênero e raça é fator de consolidação da democracia. Ela trouxe vários argumentos para defender a ampliação da participação feminina, como a maior luta por justiça social, o uso mais eficiente de recursos e até a melhoria dos padrões de comportamento político e parlamentar. “É um direito e também uma questão de justiça”, completou.

“Os dados explicam porque a gente não consegue enfrentar de forma verdadeira as violências contra a mulher”, pontuou a deputada Ana Paula Siqueira (Rede), que preside a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da ALMG.

Ritmo das mudanças é lento

No mesmo painel, a historiadora Tauá Pires avaliou que, a julgar pelo ritmo da eleição de prefeitas no País (hoje apenas 12%), levaremos 144 anos para atingir a paridade de gênero. Tauá é especialista em gestão de políticas públicas em gênero e raça e participa do Instituto Alziras, que realiza o Censo das Prefeitas.

Segundo Tauá, o censo aponta como maiores barreiras para a participação da mulher na política a violência de gênero e a falta de recursos para campanhas. “A mulher na política é mais um retrato da desigualdade no País. E 85% das prefeitas mulheres também são mães e têm que conciliar o trabalho com a maternidade”, destaca.

Já Ermelinda Melo, doutoranda do Programa de Estudos Feministas da Universidade de Coimbra (Portugal) e integrante do Observatório da Mulher na Política (ONMP) da Câmara dos Deputados, salienta que, mesmo eleita, a mulher sofre violência política e segue invisibilizada, fora da Mesa e das comissões, no caso dos parlamentos. “Muitas vezes, ela só tem o mandato para comandar”, pontua.

Violência está mais sofisticada

Na mesa “Escalada das violências contra as mulheres”, a advogada Camila Rufato Duarte, diretora da Comissão de Enfrentamento à Violência contra Mulheres e Meninas da OAB-MG, destacou que a prática da violência contra a mulher está se sofisticando junto com a tecnologia. Segundo ela, os agressores têm utilizado a inteligência artificial para criar imagens falsas de corpos nus que viralizam nas redes sociais. Ela mesma foi uma vítima recente desse tipo de prática.

Ameaças a mulheres feitas por meio virtual, como ocorreu recentemente com deputadas estaduais de Minas e vereadoras de Belo Horizonte, também estão se tornando comuns, segundo Camila. “Até o presente momento, a internet tem sido terra sem lei”, lamentou, ao constatar a falta de estrutura da polícia para lidar com esses casos e do Judiciário para punir os agressores.

Também participante da mesa, Samantha Vilarinho Mello Alves, titular da Coordenadoria Estadual de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Cedem), atentou para a necessidade de se capacitar profissionais de duas áreas que funcionam como porta de entrada para vítimas de violência: saúde e educação.

A defensora explica que a maioria dos trabalhadores dessas duas áreas não conhecem os serviços disponíveis para o atendimento e acolhimento das vítimas e nem para fazer os encaminhamentos necessários. “Muitas mulheres são atendidas na sua necessidade médica, por exemplo, mas voltam para casa e novamente são violentadas”, exemplifica.

Ela acredita que essa falta de qualificação leva à negação de direitos e contribui para a escalada da violência contra a mulher. Marlise e Ermelinda argumentaram, porém, que a saúde foi precursora no debate e ações sobre a violência contra as mulheres. “O grande problema é que Minas é um estado patriarcal e vai desmantelando o que foi feito”, afirmou Ermelinda.

Avanços e desafios

Na última mesa do ciclo de debates, “Violência política de gênero: como enfrentar?”, Ana Cláudia Oliveira, coordenadora de pesquisa do ONMP da Câmara dos Deputados, destacou avanços na atuação das mulheres nessa casa legislativa, onde ocupam apenas 20% das cadeiras. 

Ela lembrou que a Bancada Feminina, no passado conhecida como “Bancada do Batom”, ganhou caráter formal após a criação da Secretaria da Mulher na Casa e tem assento no Colégio de Líderes. “Se aprovamos, em 2021, uma lei contra a violência política de gênero, é porque essa bancada está atuando”, celebrou Ana Cláudia.

Sobre a Procuradoria da Mulher da Câmara, Ana Cláudia registrou que ela existe desde 2009 e contribuiu para que existam hoje centenas de procuradorias em vários estados e municípios brasileiros. Esses órgãos, segundo ela, tentam dar encaminhamento às denúncias que envolvem violência política de gênero, especialmente quando a conduta acontece em casas legislativas.

Primeira lei estadual

Bruna Camilo, doutora em ciências sociais e pesquisadora de gênero, misoginia e radicalização, lembrou que todas as deputadas da ALMG sofreram violência política, mesmo as menos engajadas na causa. Ela destacou a primeira lei estadual sobre o tema, produzida em Minas, apesar das pressões sofridas de alguns deputados. Mas considerou que as leis não são suficientes em um estado patriarcal.

“Combater a violência política de gênero é responsabilidade de toda a sociedade”, afirmou, acrescentando que a discussão passa pelos partidos políticos. Na visão da pesquisadora, se essas estruturas atuam de forma ilegal ou imoral buscando burlar a legislação das cotas femininas, isso também pode ser considerado violência política. “Somos quase 52% da população e, na Câmara dos Deputados, apenas 18%. A luta feminina precisa avançar muito”, concluiu.

Helen Perrella, diretora da União Brasileira de Mulheres (UBM-MG), lamentou o fato de Minas Gerais ter o maior número de denúncias de violência política de gênero. Lamentou ainda não haver um canal de denúncias voltado para essa temática. E defendeu que a sociedade se debruce sobre a ocorrência dessa forma de violência fora dos processos eletivos, em outros espaços de poder.

Fonte: ALMG.

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