A mistura entre a cor amarela vinda da floração do ipê e o cinza, resultado da queima das árvores em um lote, chamou a atenção de um morador de Lagoa Santa. Desde a criação de um loteamento na Avenida Integração, Felipe Cruz tem acompanhado a destruição da vegetação na região e o que mais surpreendeu o morador foi a resistência do ipê.
“O lote era todo arborizado e só sobrou ele. Havia outros Ipês e outras espécies de árvores, mas foram consumidas pelas chamas”, relata o responsável pela foto que ilustra esta reportagem, tirada nesta terça-feira (31/8).
A presença do ipê é explicada por um conjunto de células mortas, presentes na parte externa da casca que reveste o tronco, que conferem uma resistência muito grande ao fogo e às altas temperaturas. É o que explica o professor do Departamento de Botânica do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), da UFMG, Élder Antônio Paiva. “E esse é um dos motivos que o cerrado pega fogo e muitas espécies conseguem rebrotar após o fogo porque são protegidas por essa casca grossa”, afirma o professor, ao reforçar características da espécie Tabebuia chrysotricha. O encantamento do morador pela resistência do único ipê sobrevivente, no entanto, foi logo substituído por preocupação. Ele afirma que incêndios em lotes têm sido comuns na cidade.
“O que acontece muito aqui é que o dono do lote, quando quer construir, põe fogo para limpar e facilitar a construção. Isso acontece todos os dias”
Comum, mas ilegal…
A legislação ambiental relacionada à proibição de queimadas em lotes foi criada em 2016 por meio da Lei 3.831. E o texto é claro: em toda a cidade de Lagoa Santa, é proibida a realização de queimadas para a limpeza de terrenos, para a incineração de resíduos nas vias públicas no interior de imóveis, públicos ou privados. Apesar da resistência do ipê, a cena só desperta motivos para se lamentar, conforme pontua Élder Antônio Paiva. “É algo muito negativo”, inicia o professor do ICB.
“O fogo sempre causa dano porque é lançado material particulado no ar, monóxido de carbono no ar, gases tóxicos. A pessoa não enxerga, mas tem muita vida morrendo ali e não só as plantas: desde fungos, bactérias, insetos e pequenos invertebrados”, explica o estudioso.
Fiscalização
Segundo a lei 3.831, a fiscalização e aplicação de multas é de responsabilidade da Secretaria Municipal de Meio Ambiente. No entanto, de acordo com Élder Paiva, a fiscalização é falha e é difícil ter alguém o tempo inteiro vigiando.
Para o docente do ICB, mais que o mecanismo de controle é preciso que as pessoas se conscientizem de que sem árvores, sem a proteção do meio ambiente, o ser humano enfrentaria diversos desafios para sobreviver. “Vai chegar um momento em que o próprio ser humano desaparecerá por não resistir à destruição causada por ele. As pessoas já estão começando a sentir as consequências com a falta de água, com a diminuição dos reservatórios de água”, afirma Paiva.