A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é um dos problemas de saúde pública mais importantes no mundo, já que é um importante fator de risco para a ocorrência do AVC, acidente vascular cerebral (80%) e o infarto agudo do miocárdio (40%).
Um em cada quatro brasileiros sofre de HAS, sendo que, após os 60 anos, essa proporção ultrapassa os 50% e chega a 60% – 70% das pessoas acima dos 70 anos.
A HAS pode ser conceituada como uma doença crônico-degenerativa de natureza multifatorial, na grande maioria dos casos assintomática, que compromete fundamentalmente o equilíbrio dos sistemas vasodilatadores e vasoconstritores que mantêm o tônus vasomotor, o que leva a uma redução da luz dos vasos e danos aos órgãos por eles irrigados.
O coração é a bomba que faz o sangue rico em oxigênio e nutrientes chegar a todos os órgãos e tecidos por meio das artérias e suas ramificações. O trajeto de ida se faz pelas artérias e o de volta se faz pelas veias.
Quando o músculo cardíaco se contrai (movimento chamado de sístole), ele ejeta sangue com força para os vasos, exercendo pressão contra suas paredes. Em seguida, ele relaxa e se enche de sangue (movimento chamado de diástole).
É por isso que a aferição da pressão arterial envolve sempre duas medidas: a máxima (sistólica), exercida durante a batida do coração, e a mínima (diastólica), presente entre as batidas.
Pressão sanguínea é a capacidade do líquido sanguíneo de exercer pressão sobre os vasos, sendo finamente regulada por mecanismos fisiológicos.
O nível de pressão arterial saudável e ideal para um adulto é, no máximo, 12/8 ou 120/80 mmHg, sendo 12 a pressão sistólica, e 8 a diastólica. Esses valores devem ser levados em consideração nos momentos em que a pessoa estiver em repouso.
Quando os valores de aferição de pressão chegam ou passam de 14/9 se caracteriza a hipertensão. Nesse caso, a busca de ajuda médica é essencial para que um tratamento seja estabelecido e outras consequências da condição sejam evitadas.
Um quadro de hipotensão, ou pressão baixa, é identificado quando estes valores estão mais baixos do que 10/6. Nesse caso, é normal que a pessoa se sinta nauseada, tonta e pode, até mesmo, desmaiar.
A pressão arterial se modifica ao longo do dia, dependendo de fatores como estar deitado ou de pé, relaxado ou em atividade, nervoso ou tranquilo, estando mais baixa ao se levantar e mais elevada no final do dia.
Quando você corre, por exemplo, é natural que suas pressões sistólica e diastólica aumentem, e isso não é um problema, pois quem pratica atividade física regularmente tende a ter a pressão mais controlada e um coração que não precisa fazer tanto esforço para bombear o sangue.
Para entender o processo, imagine uma torneira ligada a uma mangueira para irrigar uma planta. Se você apertar um trecho da mangueira com a mão (aumentar a resistência), a passagem de água fica comprometida e você vai ter que abrir mais a torneira (aumentar a pressão) para manter o mesmo fluxo.
Só que, com o passar do tempo, a força exercida contra a parte mais apertada pode danificar a parede, além de forçar mais o coração, o que compromete a perfusão dos tecidos a longo prazo. Os mecanismos regulatórios da pressão sanguínea dividem-se classicamente em rápidos (ou reflexos), médios (ou humorais) e longos (ou renais).
O mecanismo rápido consiste em um conjunto de fibras autonômicas que estão em interação com os vasos e os líquidos sanguíneos, como o barorreflexo, o quimiorreflexo e o osmorreflexo.
O mecanismo médio consiste em ajustes humorais por substâncias que são produzidas e mantêm interação com seus receptores, agindo nos próprios vasos ou em centros de controle, como o óxido nítrico e a angiotensina.
O mecanismo longo ou renal consiste no controle em longo prazo do volume plasmático, no intuito de controlar a concentração de hidrogênio, sódio e outros eletrólitos.
Em decorrência de fatores genéticos, ambientais, de comportamento e de hábitos alimentares, esses mecanismos de controle são afetados, interferindo diretamente na regulação da pressão sanguínea, levando a doenças, como a hipertensão arterial.
Apesar de apresentar alta prevalência, ainda existe uma grande porcentagem de indivíduos que desconhecem serem portadores da HAS.
Dos pacientes que sabem do diagnóstico, cerca de 40% ainda não estão em tratamento ou estão com os níveis de pressão arterial descontrolados.
Sempre que uma pessoa está nervosa, o organismo libera adrenalina e a pressão tende a aumentar transitoriamente. Alguns pacientes podem apresentar valores altos apenas quando estão no médico ou no hospital – o fenômeno é chamado de “hipertensão do jaleco branco”, quadro bem mais frequente durante as consultas ginecológicas.
É por isso que o diagnóstico, em geral, envolve aferições em três diferentes ocasiões.
Pessoas acima de 20 anos de idade devem medir a pressão ao menos uma vez por ano. Se houver casos de pessoas com pressão alta na família, deve-se medir, no mínimo, duas vezes por ano.
O grande problema é que, quase sempre, não dá para perceber que a pressão está elevada. Por isso, o diagnóstico geralmente demora, ou o paciente tratado acha que está bem e se descuida no controle.
Embora raros, os sintomas podem incluir dor de cabeça, tontura, zumbido no ouvido, fraqueza, visão embaçada e sangramento nasal.
Portanto, em decorrência da alta morbimortalidade associada à HAS e dos custos elevados para o seu tratamento (principalmente o custo de suas consequências), torna-se imprescindível um diagnóstico e o tratamento adequados para a modificação da história natural da doença hipertensiva.
Em mulheres, a prevalência da HAS apresenta um aumento significativo após os 50 anos, sendo esta mudança relacionada de forma direta com a menopausa (queda do estrogênio).
Há suspeitas de que a pílula anticoncepcional possa ter contribuído para o aumento de hipertensão entre as mulheres, assim como a obesidade, sedentarismo, estresse, comida gordurosa e com alto teor de sal.
Com relação à raça, além de ser mais comum em indivíduos afrodescendentes (especialmente em mulheres), a HAS é mais grave, apresentando maior taxa de mortalidade.
A má adesão ao tratamento (incluindo a maior dificuldade de acesso ao atendimento médico), infelizmente adiciona maior risco à raça negra.
Mesmo com todos os alertas dos médicos, a hipertensão parece não preocupar as pacientes, que não verificam a pressão arterial com assiduidade e associam o problema a crises passageiras e não a uma doença que precisa de tratamento prolongado.
Mulheres desenvolvem pressão alta mais cedo que homens, de acordo com as conclusões de um estudo norte-americano que comparou a evolução da hipertensão ao longo da vida de mais de 30 mil pessoas.
Os pesquisadores do Cedars-Sinai Medical Center, em Los Angeles, na Califórnia, constataram que os vasos sanguíneos das mulheres, incluindo artérias grandes e pequenas, envelhecem mais rapidamente do que os dos homens.
Todos os pacientes diagnosticados com hipertensão precisam de maior atenção quando o assunto é COVID-19, pois são considerados grupo de risco. Já aqueles que estão com a doença descontrolada têm maior chance de sofrer com complicações quando testados positivos.
A medida da pressão arterial de forma indireta, com método auscultatório, utilizando-se esfigmomanômetro aneróide ou de coluna de mercúrio devidamente calibrados, ainda é considerada o melhor método.
A medida ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e a medida residencial da pressão arterial (MRPA) são ferramentas de grande utilidade em situações específicas.
A melhor forma de aferir a pressão em casa é utilizando um aparelho digital, de preferência o que tem a braçadeira. O mais importante é saber a maneira correta de fazer o procedimento.
No caso do primeiro, é preciso colocar a parte inferior da braçadeira em torno de 3 centímetros acima da dobra do cotovelo e deixar o fio por cima do braço. Assentado, com o cotovelo apoiado numa altura acima do diafragma ou do coração e a palma da mão virada para cima, então ligue o aparelho e deixe que ele faça toda a leitura.
Sempre que possível, utilizar o braço esquerdo, que pode apresentar números ligeiramente mais elevados em relação ao direito, pela proximidade com o coração.
As mulheres pós-menopáusicas são susceptíveis a risco maior de doenças cardiovasculares em relação àquelas que se encontram no período fértil. Em alguns casos, o risco é até maior que nos homens (acima dos 70 anos de idade), mostrando que fatores de distinção entre homens e mulheres são importantes na regulação da pressão arterial.
Isso indica o possível papel dos hormônios androgênicos nessa regulação. Nas mulheres, a presença do estrogênio pode ser um fator de regulação da pressão arterial. Estudos demonstram o papel cardioprotetor desse hormônio e o efeito de aumento da pressão arterial da testosterona.
Cerca de 90% dos pacientes diagnosticados têm a chamada hipertensão primária ou essencial, quando não há uma doença ou condição que a justifique.
Os fatores de risco são:
– Hereditariedade: a pessoa tem uma predisposição herdada do pai ou da mãe.
– Idade: a pressão alta é mais comum em indivíduos com 65 anos ou mais.
– Etnia: negros têm propensão maior à doença, segundo estudos.
– Obesidade: quanto maior o peso, maior o risco.
– Sedentarismo: a prática de exercícios regulares tem papel protetor.
– Má alimentação: baixo consumo de frutas, verduras e legumes e excesso de comida industrializada podem comprometer a saúde das artérias.
O último ano e meio da pandemia da COVID-19 foi desafiador para os pacientes e profissionais da saúde.
As ações de lockdown e medidas restritivas aumentaram a ansiedade, reduziram as possibilidades de autocuidado da população, com maior sedentarismo, pior alimentação, agravamento na utilização de álcool e drogas.
Com a pandemia de COVID-19, muitas pessoas estão descuidando da saúde por medo de se deslocar até o médico, deixando passar despercebidos sintomas importantes que iriam indicar a presença de hipertensão.
Não se esqueçam da possibilidade de fazer uma teleconsulta com seu clínico, geriatra ou cardiologista, caso prefira não sair de casa.
A pressão alta não tem cura, mas tem tratamento e pode ser controlada. Somente o médico poderá determinar o melhor método para cada paciente, pois além dos medicamentos disponíveis atualmente, é imprescindível adotar um estilo de vida saudável.
A abordagem quase sempre se inicia com medidas não farmacológicas, como prática de atividade física, redução do sal, controle do peso, melhora do sono e gerenciamento do estresse.
Mas quando a pressão está muito alta no momento do diagnóstico ou o paciente já apresenta outros fatores de risco cardiovascular, o tratamento medicamentoso é indicado logo, junto com as mudanças no estilo de vida.
Existem diferentes agentes anti-hipertensivos, com mecanismos de ação distintos. Durante a avaliação de um paciente hipertenso, alguns dados da anamnese e do exame físico servem como indício de causas secundárias que podem estar presentes.
Os principais indícios de hipertensão secundária são início antes dos 30 anos ou após os 50 anos, apnéia do sono, HAS refratária ao uso do medicamento, perda de proteína na urina, assimetria pulso femoral, sopros abdominais, doença renal e hipertireoidismo.
A HAS é, e continuará sendo, uma doença altamente prevalente e com alto impacto negativo social. A identificação precoce dos hipertensos e o tratamento eficaz são de grande importância clínica nos planos individual e populacional. Uso de aparelhos calibrados, técnica precisa e identificação de causas possivelmente reversíveis são parte fundamental no manejo clínico desses pacientes.
*Gustavo Safe é diretor do grupo formado pelo Centro Avançado em Endometriose e preservação da fertilidade, Ovular fertilidade e menopausa e Instituto Safe. Estudioso dos assuntos relacionados à saúde da mulher com enfoque na ginecologia integral e funcional, câncer, dor pélvica, infertilidade, preservação da fertilidade, endometriose, endoscopia ginecológica e cirurgias minimamente invasivas.