O cliente realiza o pedido no balcão da loja, abre o aplicativo do banco, faz a transferência do valor da compra por Pix, mostra o comprovante e vai embora com o produto. A cena, rotineira, pode esconder um golpe, que donos de lojas da Grande BH relatam ter se tornado tão frequente que eles deixaram de receber pagamento por Pix.
Em geral, não são golpes do Pix sofisticados: uma das táticas utilizadas pelos criminosos, relatam donos de estabelecimentos, é mostrar ao operador de caixa a captura da tela do aplicativo do banco logo antes da confirmação do pagamento, na etapa em que já aparecem os dados da transação, como nome do cliente e da loja. Na correria do trabalho em um comércio e quando o funcionário não tem acesso à conta bancária do estabelecimento, o golpe passa despercebido. A prática não é generalizada, e as principais entidades de representação do comércio dizem não ter relatos sobre ela, mas algumas lojas confirmam o problema.
“São pequenos golpes, de R$ 60, R$ 100. No bar, o cliente agenda o pagamento, por ter limite noturno de transferência, e depois cancela. Tenho cinco lanchonetes, e cada uma teve um prejuízo de cerca de R$ 200 em dois meses. Como é lanche rápido, nem sempre a gente para e confere a conta e o extrato para ver se o Pix caiu”, relata Noel Couto Santos, dono de sete estabelecimentos na região central de Belo Horizonte.
Há cerca de dois meses, ele suspendeu os pagamentos por Pix em todas as lojas. “Os clientes reclamam muito, dizem que não aceitamos a modernidade. Mas, enquanto o Pix não fornecer segurança, não voltaremos a aceitá-lo”, completa. Na padaria Segredo do Pão, em Contagem, clientes também reclamam que o local não aceita Pix “em pleno século 21”, conta o responsável pelo negócio, Guilherme Almeida.
Em um único golpe, a loja foi lesada em quase R$ 1.200, diz ele. “Somos uma padaria que funciona 24 horas. Em uma noite, uma pessoa veio aqui, comprou vodca, três caixas de uísque, energético. Se eu estivesse lá, desconfiaria, porque ninguém gasta tudo isso em uma padaria. A gente pede ao cliente para enviar o comprovante pelo Whatsapp, mas a chegava só até a tela da programação de Pix, com valor, nome do comércio certinho etc. Na correria, o funcionário não conferiu corretamente e liberou os produtos”, diz. Pelo menos outras duas padarias visitadas pela reportagem também suspenderam os pagamentos por Pix devido a fraudes.
Golpe do Pix pode ser enquadrado como estelionato e resultar em prisão, diz advogado
A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) afirma que golpes por Pix costumam ser registrados como estelionato praticado no ambiente virtual, cuja pena é de quatro a oito anos de reclusão e multa. Só até junho de 2022, foram 19.285 ocorrências de estelionato digital no Estado, segundo a corporação — nem todas elas têm relação com o Pix.
O crime também pode ser enquadrado como estelionato em geral, que pode levar a pena de um a cinco anos de reclusão e multa, avalia o advogado Négis Rodarte, presidente da Comissão de direito processual penal do braço mineiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG). Hoje, o estelionato é o principal crime cometido em Minas.
“O autor está agindo mediante fraude, manipulando, agindo com engodo, utilizando da malandragem. A essência do crime de estelionato é a fraude. Vejo essa atitude [o golpe do Pix] como fraudulenta e, consequentemente, como criminosa”, pondera o especialista. Minas teve 39.914 registros de estelionato até abril deste ano, de acordo com a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), aumento de 24,6% em comparação ao mesmo período de 2021.
Rodarte recomenda que o golpe sempre seja registrado na polícia e que, no ato de lavrar o Boletim de Ocorrência, a vítima deixe claro que quer uma representação na Justiça sobre o caso, o que abre portas para um inquérito policial e a eventual punição do criminoso. O advogado dá dicas de provas que devem ser reunidas para facilitar o processo: “O próprio print do suposto pagamento, alguma conversa entre as partes e acho interessante levar esse aparelho celular até um cartório para a realização da ata notarial, mostrando a imagem [do suposto pagamento], o que dará ainda mais credibilidade”, conclui.
A Polícia Civil também enfatiza a importância de denunciar. “Considerando que é um crime de ação penal pública condicionado à representação, a PCMG orienta todas as vítimas de estelionato a procurar uma unidade policial mais próxima da residência para registrar a ocorrência e fazer a representação, a fim de que o procedimento investigatório seja instaurado”, reforça nota da corporação.
Fonte: O Tempo. Foto: Videopress Produtora

















