Com queixas quanto à burocracia para acesso aos recursos públicos para a cultura, bandas de músicas de diversas partes do Estado reivindicaram, nesta quarta-feira (1/6/22), apoio financeiro para a manutenção das atividades que fazem parte da tradição dos mineiros. Integrados na Associação Salve as Bandas, maestros e dirigentes também propuseram formas alternativas para repasses de recursos e alterações nas normas sobre o financiamento cultural.
A discussão ocorreu durante audiência das Comissões de Participação Popular e de Cultura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), por solicitação de seus presidentes, os deputados Marquinho Lemos (PT) e Bosco (Cidadania), respectivamente. E reflete a realidade das centenas de bandas do Estado. São 705, segundo cadastro da Secretaria de Cultura e Turismo (Secult), e 809, de acordo com a Fundação Nacional de Artes (Funarte), presentes em 690 municípios.
A principal queixa trazida por Joanir Martins de Oliveira, presidente da Associação Salve as Bandas, foi sobre a falta de investimentos do atual governo do Estado. Segundo ele, o projeto Bandas de Minas, da gestão anterior, fez a última entrega em julho de 2019. “Depois disso, não há mais nenhuma ação de distribuição de recursos”, apontou.
Joanir também frisou que o Projeto de Lei (PL) 2.976/21, do governador, que tramita na ALMG, não contempla nenhuma das reivindicações do grupo, entregues anteriormente à Secult. A proposta altera a Lei 22.944, de 2018, que institui o Sistema Estadual de Cultura, o Sistema de Financiamento à Cultura e a Política Estadual de Cultura Viva. E é parte do plano Descentra Cultura Minas, que busca, justamente, democratizar o acesso aos bens culturais.
Sobre esse ponto, Joanir enfatizou que as Orquestras Filarmônica e Sinfônica, ambas em Belo Horizonte, consomem R$ 37 milhões/ano, o que seria quase 90% dos recursos da cultura. Enquanto isso, em todo o interior, as bandas convivem com falta de instrumentos, de local para estudos e de recursos para pagamento de maestros e custeios.
Deputado cobra recursos de emendas
Outra cobrança, trazida à discussão pelo deputado Marquinhos Lemos, foi sobre o pagamento de recursos da cultura previstos nas peças orçamentárias, boa parte fruto de emendas parlamentares. Segundo ele, para 2022 foram previstos R$ 500 mil para aquisição de instrumentos. “Diante de questões legais e eleitorais, pedimos também a destinação de outros R$ 2,6 milhões às bandas, via municípios”, salientou.
Segundo ele, mesmo com a participação efetiva da cultura nas revisões orçamentárias, o setor é o que menos tem a efetivação dos recursos. “Parece perda de tempo e é sempre a mesma história. É como um pau-de-sebo com o dinheiro na ponta, e ninguém chega lá”, comparou. O deputado criticou o fato de o governo estar chegando ao fim de sua gestão sem ter solucionado essa questão. “A cultura e as bandas não são prioridades”, destacou.
MAESTROS
Já o deputado Professor Cleiton (PV) defendeu que os maestros sejam contratados para lecionar nas escolas, sobretudo as de tempo integral, de forma a terem uma renda contínua. “Levamos essa proposta ao governo, mas não fomos ouvidos”, disse. Segundo o parlamentar, durante a tramitação da reforma administrativa proposta pelo governo, já se sabia que a fusão da cultura com o turismo prejudicaria o “lado mais fraco”. “Agora anunciam ações para outubro, justamente quando teremos eleições”, pontuou.
Na fase de debates, maestros e outros músicos e várias partes do Estado reforçaram a necessidade de apoio aos maestros, que têm como pagamento, muitas vezes, um almoço oferecido pela prefeitura após uma apresentação. Também pediram projetos sustentáveis, que assegurem o trabalho das bandas, para que não dependem de doações da própria comunidade. O trabalho social dessas agremiações, sobretudo com crianças vulneráveis, também foi salientado.
SUGESTÕES
Entre as propostas discutidas na reunião, maestros pediram mudanças no artigo 17 do PL 2.976/21 para que as premiações destinadas a pessoa física possam ser dadas também a pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos de relevância cultural. Essa seria uma forma de permitir o acesso das bandas a parte dos recursos da cultura.
Os deputados presentes se dispuseram a encaminhar emendas ao PL. Mauro Tramonte (Republicanos) também adiantou que terá emenda em conjunto com a deputada Ione Pinheiro (União Brasil) para fomentar as bandas e a atividade de maestro.
Outra sugestão é que as Orquestras Filarmônica e Sinfônica de Minas, que recebem a maior fatia do bolo da cultura, façam, em contrapartida, a formação de maestros no interior. Outras formas de repasse, via ICMS Cultural ou Fundo de Participação dos Municípios também foram sugeridas, sobretudo para fazer frente às restrições do período eleitoral.
Estado aponta falta de documentação
Um dos entraves para repasses às bandas seria a falta de documentação, segundo José de Oliveira Júnior, diretor de Economia Criativa da Secult. Ele citou recursos da ordem de R$ 2 milhões da Lei Aldir Blanc (LAB) que deveriam ser destinados às bandas, mas que esbarraram em problemas como certidões desatualizadas ou irregularidades no CNPJ. “As normas não permitem repasse sem documentação”, enfatizou.
Da mesma forma, Rosana Lemos, coordenadora de Bandas da Funarte, citou prêmio concedido pela Fundação em 2020, que recebeu 139 inscrições em Minas, sendo 49 desabilitadas por irregularidades na documentação. Ela listou ações previstas para este ano e para 2023, que incluem cursos e apresentações, mas salientou que a maioria das bandas sobrevive pela paixão de maestros e músicos.
Janaína Amaral Pereira da Silva, superintendente de Fomento Cultural, Economia Criativa e Gastronomia da Secult, reforçou que das 705 bandas do cadastro, apenas 42 estão aptas a participar dos editais da Lei de Incentivo à Cultura e do Fundo Estadual de Cultura (FEC). Isso porque já estão na plataforma digital, uma exigência para acessar os mecanismos de fomento. Segundo ela, editais, manuais e normas estão sendo revistas com o objetivo de simplificar os processos e tornar mais claras as formas de acesso aos recursos.
O subsecretário de Cultura Igor Arci Gomes também listou várias ações da Secult no sentido de trazer recursos para o segmento, como a busca de novos patrocinadores para o projeto Bandas de Minas ou a destinação de novos recursos da LAB, que podem vir da derrubada de vetos à norma. Mas admitiu que a solução passa por políticas públicas de Estado, que sobrevivam aos governos.
Ele reiterou as dificuldades impostas pelas regras eleitorais, sobretudo para a viabilização das emendas parlamentares. E também citou problemas com a documentação de municípios, que podem inviabilizar os repasses por esse caminho. Mas a equipe da Secult prometeu avaliar as sugestões colhidas na audiência.