Nenhum brasileiro sabe exatamente quanto paga de impostos. A reforma tributária em discussão no país pretende acabar com esse problema e simplificar o modelo de pagamento de tributos, copiando uma fórmula usada em quase todos os países: o IVA, o Imposto sobre Valor Agregado, que nada mais é do que a unificação de tributos. Só que no Brasil, em vez do imposto único, serão dois: um IVA federal e outro dos Estados e municípios.
Três tributos federais (PIS, Cofins e IPI) serão unificados em apenas um: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), destinada à União. E outros dois impostos – o ICMS (estadual) e o ISS (municipal) – serão unificados em outro tributo: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), destinado a Estados e municípios.
As alíquotas da CBS e do IBS ainda não estão definidas, mas o governo federal já sinalizou que Estados e municípios terão autonomia para definir a do IBS. Já a da CBS, de competência federal, deve ficar em 12%.
Juntando os dois impostos, a estimativa é de uma cobrança de cerca de 25% de IVA, com exceção de produtos e serviços considerados em regime especial, como os itens da cesta básica, que serão isentos de impostos; medicamentos, que terão a alíquota do IVA reduzida em 60%; e alguns serviços como educação, saúde e produção cultural, também com redução de 60% de alíquota.
“É possível ter uma alíquota menor que 25% no futuro [como já disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad]”, afirma o coordenador do grupo de trabalho da reforma tributária na Câmara, deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG). Ainda segundo ele, os itens de primeira necessidade “terão redução imediata [de preços]”.
Ainda defendendo a implantação do novo modelo, o deputado diz que muitos setores são beneficiados no sistema atual sem uma regra clara.
“O Brasil tem tantas renúncias e incentivos fiscais, tanta judicialização. Hoje, temos um modelo de exceção. O IVA não dá exceções genericamente, mas objetivamente. Se fala em serviços, por exemplo, diz quais são. As exceções têm base técnica”, jusitifica.
Cálculo do imposto no novo sistema
O cálculo do IVA é mais fácil e transparente. Como o imposto será cobrado sobre o valor agregado em cada etapa da cadeia, basta aplicar a porcentagem em cada nível desde a produção até a chegada do produto ao consumidor final.
Vamos usar como exemplo um IVA de 12% na compra de um par de sapatos pelo consumidor por R$100. Nessa situação, o imposto do produto corresponderia a R$12.
Para fazer a divisão entre os processos da cadeia produtiva, vamos considerar 4 etapas: a produção na fábrica de calçados, a venda no atacado, a distribuição e finalmente a chegada no varejo.
Suponhamos que na primeira etapa, na fábrica de calçados, o par de sapatos sai para a venda no atacado a um preço de R$ 40. Nesta primeira fase haveria a incidência de 12% sobre o valor total, ou seja, o IVA seria de R$ 4,80 somente nesta etapa.
Na segunda etapa, da venda no atacado, o valor do produto subiria para R$ 65 para a distribuição. Neste caso, seria cobrado o IVA de 12% sobre a diferença de valores nas etapas: R$ 65 – R$ 40 = R$ 25. O IVA incidirá sobre esses R$ 25, ou seja, seria de R$ 3.
Na terceira fase, da distribuição, o preço do par de sapatos sobe para R$ 85. Mais uma vez, o IVA será cobrado sobre a diferença de valores nas etapas de produção: R$ 85 – R$ 65 = 20. O IVA de 12% incidirá sobre os R$ 20, o que daria R$ 2,4.
Na última etapa, do varejo, o par de calçados atinge o preço de R$ 100 para a venda ao consumidor. Novamente, o imposto será cobrado sobre a diferença de valores entre as etapas: R$ 100 – R$ 85 = R$ 15. Logo, o IVA de 12% seria de R$ 1,80. Cada setor do processo produtivo seria responsável pelo pagamento do imposto de sua respectiva etapa de produção.
No modelo antigo, ainda em vigor, os impostos são cobrados sobre o preço cheio em cada etapa, acumulando valores e levando cada setor a pagar mais tributos do que deveriam. Outra novidade após a aprovação da reforma será a possibilidade da empresa poder também descontar o que pagou de imposto com outros insumos, como energia, maquinário e serviços, o que hoje não acontece.
IVA nos combustíveis
A reforma tributária estabelece um regime de tratamento diferenciado para combustíveis e lubrificantes. O IVA dual, com alíquota única em todo o território nacional e variando conforme o tipo de produto, será cobrado apenas uma vez na cadeia produtiva, no refino ou na importação. A mudança segue uma reforma proposta em 1992.
Segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), a mudança levará a uma forte alta do preço final aos consumidores. No entanto, o impacto ainda é incerto porque muitos pontos do regime diferenciado para os combustíveis serão definidos por lei complementar e a reforma prevê a possibilidade de concessão de créditos tributários.
IVA em outros locais do mundo
Na Europa, a adoção do IVA foi necessária para permitir a integração econômica do continente. O imposto também está presente na maior parte da América Latina. Índia, Canadá, Austrália e Nova Zelândia são outros exemplos de países que adotaram o modelo.
Os Estados Unidos são a única grande economia que não tem esse tipo de imposto agregado. O país possui um tributo cobrado pelos governos regionais somente na última etapa da cadeia, a venda ao consumidor. Na prática, o efeito é o mesmo do IVA em termos de não-cumulatividade, mas o risco de sonegação é maior. Mesmo assim, e portanto, no país também é adotado um imposto único sobre consumo.
Fonte: O Tempo.