A variante Delta do novo coronavírus, originária da Índia, pode aumentar o risco de reinfecções da Covid-19. É o que sugere um estudo recém-publicado na renomada revista científica Cell. A pesquisa foi liderada pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, e contou com a colaboração científica de 59 pesquisadores incluindo a participação da Fundação Oswaldo Cruz.
De acordo com o estudo, a reposta imunológica de pessoas que já foram infectadas por outras cepas é menos potente contra a variante Delta. O problema é observado com mais frequência entre os indivíduos anteriormente infectados pela variante Gama, identificada originalmente em Manaus e atualmente dominante no Brasil, assim como pela variante Beta, detectada pela primeira vez na África do Sul. Nestes casos, a capacidade de neutralizar a cepa Delta é onze vezes menor. PUBLICIDADE
Os pesquisadores analisaram a ação de 113 soros, obtidos a partir de pacientes infectados e imunizados, sobre seis cepas do novo coronavírus: uma linhagem próxima do vírus inicialmente detectado em Wuhan, na China, no começo da pandemia; as variantes de preocupação Alfa, Beta, Gama e Delta; e a variante de interesse kapa, que é intimamente relacionada à variante delta, sendo também um subtipo da linhagem B.1.617.
Segundo o estudo, a capacidade de neutralizar a cepa é 2,5 vezes menor para o imunizante da Pfizer e 4,3 vezes menor para o da Astrazeneca. Apesar da resposta imunológica de pessoas vacinadas ter potência reduzida contra a variante Delta, os dados apontam que as vacinas continuam efetivas. Os autores do trabalho ressaltam que os índices são semelhantes aos verificados com as variantes Gama e Alfa – que surgiram no Brasil e no Reino Unido, respectivamente. Não há evidência de fuga generalizada da neutralização, diferentemente do registrado com a variante Beta – com origem na África do Sul.
“Parece provável, a partir desses resultados, que as vacinas atuais de RNA e vetor viral fornecerão proteção contra a linhagem B.1.617 [que possui três sublinhagens, incluindo a variante Delta], embora um aumento nas infecções possa ocorrer como resultado da capacidade de neutralização reduzida dos soros”, afirmam os pesquisadores no artigo.
No Brasil, pelo 11 casos da variante Delta já foram detectados, com a confirmação de duas mortes, a de uma mulher grávida, no Paraná e de um tripulante indiano no Maranhão. As infecções causadas pela variante Delta foram diagnosticadas em viajantes no Maranhão, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e Goiás. No dia 19 de junho, a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia confirmou o primeiro registro de transmissão local da cepa.
Assim como outras variantes de preocupação, a Delta possui mutações na região do genoma responsável por orientar a produção da proteína espícula do novo coronavírus – também chamada de proteína S ou Spike. Essa molécula, que se localiza na superfície da membrana viral, compondo a coroa do vírus, é responsável pela primeira etapa do processo de infecção: a adesão do vírus às células. Por isso mesmo, é o alvo dos anticorpos mais potentes produzidos pelo organismo para neutralizar o Sars-CoV-2.
Segundo os cientistas, mutações na proteína S podem ser positivas para o vírus de duas formas. De um lado, aumentando sua capacidade de adesão aos receptores presentes células do hospedeiro, o que leva à maior transmissibilidade do patógeno. De outro, modificando a região da proteína S onde se ligam os anticorpos, permitindo, assim, que o vírus escape do sistema imune.
As análises do novo estudo mostram que a afinidade da variante Delta pelos receptores celulares é maior do que a observada nas linhagens que circularam no começo da pandemia. No entanto, é inferior à verificada com as outras variantes de preocupação. Por outro lado, a variante originária da Índia apresenta um perfil antigênico bastante divergente em relação aos outros vírus estudados.
A variante Delta, que surgiu na Índia em outubro de 2020, é um subtipo da linhagem viral B.1.617. Em maio deste ano, após ser associada ao agravamento da pandemia na Índia e no Reino Unido, a cepa foi declarada como variante de preocupação pela Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com a OMS, a variante circula em, pelo menos, 92 países do mundo. Além disso, nove nações sequenciaram vírus da linhagem B.1.617, sem realizar a identificação da sublinhagem viral.