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Desequilíbrios ambientais elevam as chances de novas epidemias

Por Dentro De Tudo:

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Incêndios de grandes proporções, enchentes, chuvas menos regulares e desaparecimento de ilhas são algumas das consequências das aceleradas mudanças climáticas provocadas pelo homem no planeta. Mas as questões ambientais vão muito além e podem induzir a uma situação muito mais silenciosa, mas não menos impactante: a ampliação ou surgimento de doenças infecciosas, especialmente as provocadas por vírus. 

O avanço do homem para áreas mais intocadas, principalmente por meio do desmatamento, pode colocar populações em contato com novos vetores ou patógenos. Foi assim com o Sars-Cov-2, que possivelmente entrou em contato com o ser humano por meio de mercado de animais vivos silvestres na região de Wuhan, na China. E como o homem continua avançando para florestas em todos os cantos do mundo, há sempre uma grande chance de ter contato com novos vírus, potencializando possibilidades de surgimento de epidemias. 

De acordo com Flávio Fonseca, professor da UFMG e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, há vários casos documentados de doenças que surgiram após desequilíbrios ambientais em determinados espaços. Desmatamento e mudança no regime de chuvas são alguns fatores motivadores para os fenômenos. 

“Vejamos o caso do vírus ebola. No Congo, as maiores epidemias de ebola coincidem com os anos mais secos. Quando há um bom regime de chuvas, a população conta com boa colheita, mas em anos de seca, a agricultura fica comprometida e os habitantes do país precisam adentrar nas matas para buscar alimentos, tendo maior contato com animais e vírus”, relata o professor. Uma das formas de transmissão do ebola é a manipulação de animais contaminados. 

Segundo Fonseca, a falta de chuvas também pode provocar a saída dos animais do habitat, levando doenças até os homens. “Existe um vírus, primo da varíola, que circula por regiões rurais que tem os roedores silvestres como hospedeiros naturais. Quando a chuva diminui, esses roedores entram nas fazendas em busca de alimentos nas silagens. Eles podem urinar nos cochos, transmitindo o vírus para as vacas. Um ordenhador que toca nas lesões do animal também acaba sendo infectado”, relata o pesquisador, lembrando que o tráfico de animais silvestres também contribui para que seres humanos tenham contato com novos vírus, bactérias e outros patógenos. 

Potencial para surtos de doenças

O aquecimento do planeta também é fator fundamental para a expansão de doenças que antes tinham ocorrência apenas em países tropicais. Conforme os países em maiores latitudes vão ficando mais quentes e oferecem melhores condições para patógenos e hospedeiros, doenças como dengue, malária e febre amarela vão se espalhando por mais espaços geográficos. Relatos de casos de chikungunya e Zyka, na década passada, em países europeus, são exemplares dessa situação.

“A dengue e a febre amarela não existiam em certas latitudes ou cidades localizadas em montanhas, mas à medida que o planeta vai se aquecendo, essas doenças vão avançando para novos espaços. Os vetores dessas doenças, que são mosquitos, estão sobrevivendo em locais em que não viviam antes”, explica Henrique Paprocki, biólogo e curador do Museu de Ciências Naturais da PUC Minas. 

Enquanto uns patógenos ganham novos territórios, outros aparecem como novidades para o ser humano. “Todos os dias estamos tendo contato com novos vírus e existe a possibilidade de alguns deles provocarem doenças graves. Quando isso pode gerar uma nova pandemia é uma loteria, pode ser amanhã ou daqui cem anos”, diz. 

Maior floresta do mundo, a Amazônia tem um potencial de ser ponto inicial para futuras epidemias conforme o desmatamento avança, principalmente por causa de monoculturas e pecuária. Para Papricki, o Brasil poderia fazer a diferença ao proteger seu tão importante bioma. 

“O Brasil tem a oportunidade de ser vanguarda, de ser um país que promove o desenvolvimento econômico com conservação da natureza. Mas não é esse o sinal que estamos dando para o mundo”, critica o biólogo.

Monitoramento pode evitar pandemias e superbactérias
Durante conferência da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) realizada neste mês, a relação entre doenças infecciosas e as mudanças climáticas foi debatida por pesquisadores de diferentes áreas.

Pesquisadores defenderam que a ciência invista em monitoramento de fungos e bactérias para evitar futuras epidemias – e não apenas de vírus. A preocupação é sobretudo sobre a possibilidade de surgimento de superbactérias que sejam ainda mais resistentes aos antibióticos disponíveis na indústria farmacêutica. 

“A Organização das Nações Unidas (ONU) calcula que hoje são 700 mil mortos por ano por conta da resistência aos antibióticos, mas, se não fizermos nada, em 2050 serão 10 milhões por ano”, afirmou a pesquisadora Andrea Dessen, pesquisadora do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), da França, durante a abertura da conferência. 

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