A diabetes se revela como uma condição silenciosa, causando danos ao coração, rins e vasos sanguíneos de milhões de brasileiros antes de apresentar qualquer sintoma. Comumente associada ao açúcar, a doença engloba um amplo espectro, sendo uma condição metabólica crônica que afeta a maneira como o corpo utiliza a glicose, essencial para as células. Quando a concentração de glicose permanece elevada por longos períodos, essa substância torna-se tóxica, propensa a gerar inflamações, desgastar artérias e comprometer órgãos vitais.
O desenvolvimento da doença é insidioso. Pesquisas indicam que a diabetes pode dobrar, ou até quadruplicar, o risco de infarto e Acidente Vascular Cerebral (AVC). Atualmente, estima-se que uma em cada 13 pessoas no Brasil seja afetada, muitas sem diagnóstico. De acordo com o Atlas Global da Federação Internacional de Diabetes, existem 589 milhões de adultos com a doença no mundo, com o Brasil ocupando a sexta posição global, contabilizando mais de 16 milhões de indivíduos afetados. Em 2024, 111 mil brasileiros faleceram devido a complicações relacionadas à diabetes.
O impacto da diabetes se dá de maneira perigosa ao causar danos nas artérias, além do aumento dos níveis de glicose no sangue. O acúmulo crônico de açúcar provoca microfissuras, inflamações e obesidade nas paredes dos vasos, alterando sua estrutura ao longo do tempo. O cirurgião cardiovascular Ricardo Katayose, da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, ressalta que níveis elevados de glicose iniciam uma cascata de inflamação e estresse oxidativo, prejudicando o endotélio das artérias e facilitando a formação de placas de gordura, conhecidas como aterosclerose. Este processo pode ocorrer de forma silenciosa, permitindo que o paciente mantenha uma rotina normal enquanto desenvolve obstruções significativas.
Os danos não se limitam ao sistema cardiovascular. A diabetes também compromete outros órgãos, levando a problemas renais, como insuficiência renal; a riscos oculares, que podem resultar em retinopatia e perda de visão; além de afetar nervos periféricos, o que aumenta a probabilidade de feridas que não cicatrizam, com o risco de amputações.
O Brasil, na sexta posição mundial em casos de diabetes, se destaca em um cenário global, apesar de contar com uma população menor em comparação a outros países. A endocrinologista Cláudia Cozer Kalil, do Hospital Sírio-Libanês, explica que as mudanças nos hábitos de vida nas últimas décadas — incluindo o aumento no consumo de alimentos ultraprocessados, sedentarismo e noites mal dormidas — têm contribuído para o crescimento da doença em faixas etárias mais jovens. Adolescentes já chegam aos consultórios apresentando quadros de pré-diabetes, sendo que cerca de 80% dos casos de diabetes tipo 2 estão associados ao acúmulo de gordura abdominal.
Embora a diabetes tipo 1 e tipo 2 compartilhem complicações, elas surgem de origens distintas. O endocrinologista Augusto Santomauro Junior, da Beneficência Portuguesa e da Faculdade de Medicina do ABC, esclarece que, enquanto no tipo 1 há a ausência total de produção de insulina, no tipo 2, o corpo não responde adequadamente à insulina disponível. A insulina, descoberta na década de 1920, transformou a diabetes tipo 1 – uma condição fatal para jovens – em uma doença tratável. Atualmente, porém, a diabetes tipo 2, relacionada ao estilo de vida, é a que mais preocupa, apresentando maiores índices de internações, complicações cardiovasculares e mortes.
Com os avanços na medicina, novos medicamentos como análogos de GLP-1 e inibidores de SGLT-2 têm revolucionado o tratamento da diabetes tipo 2. O cirurgião cardiovascular Ricardo Katayose relata que essas terapias têm promovido um controle metabólico significativo, resultando em diminuição da glicemia e melhora na hemoglobina glicada, facilitando o manejo da pressão arterial. A endocrinologista Lyz Helena Lopes confirma que essas medicações têm mostrado redução consistente de infartos, AVCs e mortalidade cardiovascular. Contudo, ainda existem incertezas sobre a eficácia dessas terapias a longo prazo, especialmente em relação à função renal e cardíaca.
Apesar das inovações no tratamento, a diabetes ainda figura entre as principais causas de morte no Brasil, impulsionada por barreiras sociais, estruturais e comportamentais que dificultam o acesso ao tratamento adequado. A endocrinologista Cláudia Schimidt, do Hospital Israelita Albert Einstein, destaca que a prevalência da doença está intimamente ligada à obesidade crescente. Além disso, o tratamento eficaz requer mudanças sustentáveis no estilo de vida, o que pode ser desafiador para muitos pacientes.
A inequidade no acesso a cuidados médicos e tecnologias modernas agrava o cenário. Embora existam opções de tratamento com benefícios comprovados, como os agonistas de GLP-1, seu custo elevado frequentemente impede o acesso pela população, já que esses medicamentos não estão amplamente cobertos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O endocrinologista Clayton Luiz Dornelles Macedo observa que, enquanto a medicina já possui as diretrizes do que deve ser feito, o desafio maior reside em garantir acesso e educação em saúde para a população.
A boa notícia é que uma parte significativa do risco pode ser modificada. Estratégias como a perda de 5% a 10% do peso corporal, a prática de caminhadas e uma dieta balanceada podem ajudar a controlar os níveis de glicose e pressão arterial. Sinais de alerta como sede excessiva, micção frequente, fadiga, infecções recorrentes e perda de peso involuntária devem ser investigados prontamente.
Fonte: g1.globo.com
Crédito da Foto: Danielly Freitas – PMFS



















