Acordar às 4h50, pegar o ônibus das 5h40, atravessar a cidade e chegar cedo para, às 7h, assumir o plantão de 12 horas na portaria do edifício comercial Helena Passig, no centro de Belo Horizonte, por onde passam mais de 1.500 pessoas por dia. Essa é a rotina, a cada dois dias, de Wilson Lourenço, 67, funcionário do condomínio desde 1986. Ele é um dos mais de 6.000 porteiros com mais de 60 anos em Minas Gerais.
Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), essa é a quarta função que mais emprega profissionais 60+ no Estado: do total de registrados, pelo menos 13,34% estão nessa faixa etária.
Trata-se de uma profissão cheia de desafios. Trabalhar com atendimento ao público exige atenção, gentileza, paciência, controle emocional e firmeza no cumprimento das normas.
Habilidades que, na opinião do advogado especializado em direito imobiliário Kênio Pereira, muitas vezes faltam a pessoas mais jovens, mas tendem a prevalecer nas mais experientes. Essa é, inclusive, uma das hipóteses para o fato de tantos condomínios preferirem contratar porteiros acima dos 60 anos. “É um cargo de confiança. E pessoas mais maduras transmitem isso”, sugere.
Para Lourenço, apaixonado pela profissão, o porteiro é o “espelho” do condomínio. Afinal, é o primeiro contato com o visitante. “Entram pessoas de todas as faixas de idade e classe social: idosos, com quem a gente tem que ter certo carinho, pessoas com deficiência. É um tratamento que tem que ser igual para todo mundo”, diz.
Disposição
O primeiro contato dele com um condomínio foi aos 17 anos, quando era ascensorista. Entre idas e vindas a outros ofícios, voltou aos prédios há 38 anos. Atuou no elevador do Helena Passig por 18 anos, até conseguir a oportunidade de ser porteiro no edifício. Ele conta que se sentia preparado por ter tranquilidade, boa comunicação, boa caligrafia e disposição para o ofício.
“Se um dia eu sair de lá, meu choro será de alegria por trabalhar por mais de 50 anos e ter desenvolvido um trabalho tão bonito e abençoado”, observa.
Ele conta que chegou a ter jornada dupla, trabalhando na portaria de dois condomínios ao mesmo tempo. Por volta dos 60 anos, a rotina ficou pesada para a idade.
“Vinha em casa, às vezes, só para pegar a marmita”, relata. Com três filhos e quatro netos, o porteiro está aposentado, mas diz que continua no emprego por prazer.
Maturidade é importante diferencial
Na visão do advogado Kênio Pereira, profissionais 60+ têm habilidades para função de porteiro que muitos jovens não têm. Uma delas é “jogo de cintura” em situações adversas.
“A pessoa idosa, pela vivência, pela experiência de vida, é mais paciente. Sabe, às vezes, contra-argumentar sem agredir. Jovem não está acostumado”, compara.
Ele acrescenta que há menos rotatividade com porteiros mais maduros, o que é importante no condomínio. Além disso, Kênio observa que o porteiro deve garantir segurança e ordem no prédio, mas deve ser respeitado.
O porteiro Daniel Silva, 62, reforça que a função exige habilidades que poucos têm. A principal delas é “lidar com o ser humano”.
Fonte: O Tempo.