O advogado Cleydson Lopes é alvo de uma ação indenizatória aberta pelo juiz da a 2ª Vara Criminal de Jacarepaguá, Aylton Cardoso. O magistrado [foto em destaque] questiona a divulgação de um vídeo gravado pelo advogado durante audiência. Na sessão, Cardoso chegou a determinar a apreensão do celular de Lopes para que o registro fosse apagado. Ao deixar o tribunal, Lopes recuperou o vídeo na lixeira de seu telefone e o publicou em sua rede social.
Na mesma ação, o juiz conseguiu decisão liminar que obriga o advogado a apagar o vídeo e as menções ao caso de suas redes sociais, sob pena de multa diária de R$ 10 mil. A gravação que gerou o imbróglio foi feita em março. Nela, Lopes filma a si mesmo enquanto uma testemunha é ouvida. A sessão é interrompida após reclamação da promotora de Justiça Ermínia Manso.
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“O senhor está gravando, doutor? Mas o senhor não avisou nem a testemunha nem a ninguém”, disse a promotora. “Mas a gravação é minha, Excelência, artigo 367 do CPC”, respondeu Lopes. O advogado citava o artigo do Código de Processo Civil (CPC) que afirma que a gravação de audiências de instrução e julgamentos por quaisquer das partes é permitida, independentemente de autorização judicial.
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O celular de Lopes foi apreendido e só foi devolvido depois que o advogado apagou as imagens. Horas depois, as imagens foram recuperadas da lixeira do aparelho e divulgadas. Para o juiz Aylton Cardoso, a divulgação do vídeo teve a intenção de “intimidar” e causar “constrangimento” ao juízo.
“Há indícios de que o conjunto de ilícitos e crimes praticados dessa forma têm por finalidade constranger o Juízo em razão da decisão prolatada em audiência, ora reafirmada neste decisum, e, mais do que isso, em contexto de contínua ameaça de reiteração de crimes contra a honra, cuja prática persiste e se renova quotidianamente em canais de redes sociais controlados ou influenciados pelos advogados antes referidos, levar o magistrado a rever a sua decisão, de forma contrária à sua consciência, independentemente de recurso judicial”, afirma Cardoso.
Cardoso alegou que a proibição de registro de audiências sem autorização está expressa na Resolução TJ/OE/RJ n°. 16/2013, na forma do artigo 24, XI da Constituição, que “exige a prévia ciência às partes acerca da utilização do registro audiovisual e veda a divulgação não autorizada dos registros audiovisuais a pessoas estranhas ao processo”.
Multa de R$ 50 mil
Sobre o artigo 367 do CPC, citado por Lopes, o magistrado afirmou se tratar “de um direito processual da parte e não um direito do advogado, muito menos uma prerrogativa deste”.
Antes da audiência seguinte do caso onde Lopes atua como defensor, realizada no dia 23 de maio, o juiz determinou uma multa de R$ 50 mil em caso de nova gravação não autorizada. O magistrado também determinou a revista e busca pessoal das pessoas que participariam da audiência e a custódia de todos os celulares no cartório da 2ª Vara Criminal.
O advogado foi notificado da ação indenizatória durante a audiência do dia 23, assim como da decisão liminar que o obrigou a apagar a gravação de suas redes sociais. Na sessão, Lopes estava acompanhado de conselheiros da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro (OABRJ), representantes da presidência do órgão e da Comissão de Prerrogativas da seccional.
Posição da OAB
Os delegados da OAB rejeitaram as restrições determinadas pelo juiz Aylton Cardoso, argumentando a inexistência de “justo motivo ou razão legal para o procedimento invasivo de revista e busca pessoal, bem como quanto ao acautelamento do aparelho celular, visto que é um instrumento de trabalho e de uso pessoal, o qual não pode ser violado sem ordem legal e específica para esse fim”.
Cardoso acabou voltando atrás nas restrições impostas, mas determinou que o celular de Lopes permanecesse desligado durante a sessão.
Em nota enviada à coluna em março, o juiz Aylton Cardoso afirmou que a proibição de registro das audiência visa proteger o direito à intimidade das vítimas e disse que a norma do CPC apontada como argumento pelo advgado não pode se opor ao ordenamento jurídico do Código de Processo Penal (CPP) sobre a questão. Leia abaixo a íntegra da nota:
“Informo que, diante da percepção de gravação que não pelo Judiciário, houve requerimento do Ministério Público e protesto da testemunha, momento em que foi determinada, pelo Juízo, a interrupção da gravação que estava sendo realizada pelo advogado. Como o autor da gravação se dispôs a apagar os vídeos, não houve necessidade de ocorrer qualquer outra intervenção, muito menos apreensão do celular.
Sobre a alegação de que o Código de Processo Civil supostamente autorizaria a gravação sem autorização em um processo criminal, informo que, em cumprimento à lei processual penal, os depoimentos em audiência são gravados mediante registro audiovisual realizado pelo próprio Juízo em forma digital, com acesso disponível às partes, não sendo possível aplicar o Código de Processo Civil por analogia, uma vez que o artigo 405, §1°., do Código de Processo Penal regula exaustivamente e de forma específica a hipótese.
Esse entendimento está em harmonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, que, nos autos do Ag.Reg. nos Emb.Decl. na Reclamação 23.045-SP e Habeas Corpus 490.599-SP, respectivamente, decidiram que ‘… que a aplicação, no processo penal, de regras contidas no Código de Processo Civil pressupõe a existência de lacuna normativa …’, e o art. 405, § 1º, do CPP, disciplina a possibilidade do registro audiovisual nas audiências criminais.
Trata-se, portanto, de norma específica que pode afastar a incidência suplementar do CPC. Além do mais, deve ser considerado ainda o direito à intimidade, no caso da vítima, garantido nas disposições dos arts. 5º, LX, e 93, IX, ambos da Constituição Federal”.