Maioria no país, alunos mais pobres têm menor aprendizado em leitura

Por Dentro De Tudo:

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O Estudo Internacional de Progresso em Leitura (PIRLS) revelou um retrato preocupante sobre as disparidades educacionais no Brasil, destacando a relação entre o nível socioeconômico dos alunos e seu desempenho em leitura. A análise, feita pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), mostrou que os estudantes com menor nível socioeconômico (NSE) enfrentam dificuldades consideráveis, com quase metade deles apresentando desempenho abaixo do nível básico.

Os dados indicam que, enquanto 83,9% dos alunos do 4º ano do ensino fundamental com renda mais alta têm acesso a um aprendizado adequado em leitura, apenas 26,1% dos estudantes de famílias mais pobres conseguem alcançar esse nível. A diferença de 58 pontos percentuais entre os dois grupos no Brasil é a maior entre os países participantes da avaliação.

No Brasil, a disparidade é ainda mais evidente quando se observa a composição socioeconômica dos alunos. Apenas 5% dos estudantes têm nível socioeconômico alto, proveniente de famílias com renda superior a R$ 15 mil mensais, e apresentam os melhores resultados. Em contraste, 64% dos alunos vêm de famílias com renda inferior a R$ 4 mil por mês, apresentando os piores desempenhos em leitura. Já 31% dos alunos se situam em um nível socioeconômico médio.

Ernesto Martins Faria, diretor-fundador do Iede, alerta para a gravidade da situação: “Não é que não exista um cenário de boa aprendizagem no Brasil, existe, só que é para poucos. Isso tem que incomodar muito a gente. Por que tem um grupo pequeno que consegue chegar a um nível de aprendizagem competitivo em nível internacional, e por que, quando a gente olha para os [estudantes] de baixa renda, a situação de aprendizagem é tão complicada?”

A Importância da Leitura no Desenvolvimento Educacional

Os especialistas ressaltam que a leitura é uma competência essencial, não apenas para o aprendizado de língua portuguesa, mas também para o desenvolvimento de outras habilidades acadêmicas e sociais. Segundo Faria, “quando a gente está falando de leitura, a gente não está falando de uma disciplina específica. A leitura é uma competência basilar que ajuda a desenvolver várias outras competências, como matemática e ciências.”

Infelizmente, quase 40% dos estudantes brasileiros do 4º ano não dominam habilidades básicas de leitura. Este dado evidencia a carência de preparação de uma parte significativa da população estudantil para enfrentar os desafios educacionais mais complexos.

Desigualdades de Gênero e Influência do Ambiente Familiar

Além da disparidade socioeconômica, o estudo apontou desigualdades de gênero no desempenho em leitura. O percentual de meninos com desempenho abaixo do básico é de 44,1%, enquanto entre as meninas esse índice é de 33,3%. No entanto, no grupo de alto desempenho, a diferença é menor, com 12,7% das meninas atingindo esse nível, contra 9,7% dos meninos.

Outro fator importante é o contato prévio com a leitura. Estudantes que tinham contato frequente com livros antes do ensino fundamental têm um desempenho significativamente melhor, com 49,7% alcançando um nível adequado de aprendizado. Em contrapartida, aqueles que tiveram esse contato apenas ocasionalmente alcançam 36% de desempenho adequado.

Além disso, a leitura em casa desempenha um papel crucial. Crianças cujos pais têm o hábito de ler apresentam um aprendizado mais avançado. A pesquisa revelou que 47,6% dos alunos cujos pais gostam muito de ler alcançam o nível adequado de aprendizado, enquanto entre os filhos de pais que não têm o hábito de ler, o índice cai para 32,6%.

Políticas Públicas para Reduzir Desigualdades

Diante desses dados alarmantes, especialistas como Faria defendem a necessidade de políticas públicas mais eficazes para enfrentar as desigualdades educacionais no Brasil. Ele sugere que é essencial direcionar recursos e investimentos para as regiões mais vulneráveis, garantindo não apenas melhores infraestruturas escolares, mas também a presença de bons professores.

“É necessário garantir que bons professores atuem em áreas socioeconômicas mais vulneráveis e que as escolas nessas regiões tenham a infraestrutura necessária para proporcionar um ambiente de aprendizado adequado”, afirma Faria.

O PIRLS, aplicado pela primeira vez no Brasil em 2021, evidenciou que o Brasil tem um longo caminho a percorrer para reduzir as desigualdades educacionais. A análise aprofundada dos microdados busca dar visibilidade à situação dos alunos mais vulneráveis e despertar a sociedade e os gestores públicos para a urgência em promover políticas que favoreçam a equidade no acesso e na qualidade do ensino.

Em um país onde as disparidades socioeconômicas continuam a marcar a educação, a implementação de políticas educacionais mais equitativas se torna uma prioridade para garantir que todos os estudantes, independentemente de sua origem, tenham a oportunidade de alcançar um aprendizado adequado e competir em um nível internacional.

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