Desde que o jogador Daniel Alves foi preso após denúncia de agressão sexual na Espanha, na última sexta-feira (20), cerca de 44 pessoas podem ter sido vítimas do mesmo tipo de crime em Minas Gerais. Os dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) mostram que, entre janeiro e novembro de 2022, a cada dia foram registradas 11 ocorrências de estupro ou tentativa de estupro no Estado. Isso significa uma média de um regostro a cada hora.
Nos primeiros 11 meses do ano passado, o Estado registrou 3.693 estupros, tentativas de estupro, estupro de vulnerável e tentativas de estupro de vulnerável. Apesar da estatística da pasta não especificar o número de delitos cometidos contra mulheres ou homens, levantamento realizada pelo O TEMPO mostra que, na última semana, dos sete casos de maior repercussão, em apenas um deles a vítima era um menino de nove anos. Nos outros seis casos, as vítimas foram pessoas do sexo feminino com idades entre 4 e 65 anos. Uma das mulheres foi estuprada e morta após o crime.
Outro ponto notado é que, destes sete crimes noticiados, todos os autores eram homens e, entre eles, principalmente pessoas próximas das vítimas, sendo um namorado, um tio, um primo e um avô. Nesta segunda-feira (23), a Polícia Civil divulgou a prisão de um homem por estuprar 13 meninas de sua família, na cidade de Três Marias, no Norte de Minas.
Segundo o Anuário de Segurança Pública de 2022, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no Brasil a proporção destes crimes em 2021, por gênero, indicam que 88,2% das vítimas eram do sexo feminino e 11,8% do sexo masculino.
“Resquício da sociedade patriarcal e escravocrata”, diz especialista
Especialista em políticas públicas e doutora em ciências sociais, a historiadora Renata Rosa, que também foi a criadora do Observatório Estadual das Desigualdades de Gênero de Minas Gerais, pontua que os números de violência contra a mulher, sexual ou não, são um “resquício da sociedade patriarcal e escravocrata”.
“Até hoje as mulheres continuam sendo tratadas como propriedade, como objeto, como algo que você pode consumir e descartar. Infelizmente, por isso, vemos esses números de violência sexual, de feminicídio, cada vez mais escancarados, apesar de todos os avanços da nossa sociedade”, pondera.
Ainda conforme ela, o Estado não é neutro nessa questão, já que orienta o comportamento da sociedade. “Precisamos discutir essas relações desiguais de poder na sociedade, entre homens e mulheres. É preciso ser levantado como uma questão prioritária, para compreender o porquê de boa parte dos homens, apesar de tantos avanços nas políticas públicas, ainda tratarem as mulheres como propriedade, como mercadoria”, completa Renata.
Meio milhão de vítimas de violência sexual em 10 anos
Ainda de acordo com o Anuário de Segurança Pública de 2022, em todo o Brasil foram pelo menos 583 mil pessoas vítimas de estupro ou estupro de vulnerável entre os anos de 2012 e 2021. Somente em 2021 foram 66.020 boletins de ocorrência registrados por estes crimes no país, uma taxa de 30,9 por 100 mil habitantes e um crescimento de 4,2% em relação ao ano anterior
Apesar do número já ser alarmante, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, responsável pelo estudo, afirma que, na realidade, esse dado deve ser bem maior. “Estes dados correspondem ao total de vítimas que denunciaram o caso em uma delegacia de polícia e, portanto, a subnotificação é significativa”, detalha.
O estudo aponta ainda que a maior parte das vítimas de estupro no país são vulneráveis, o que inclui crianças menores de 14 anos e adultos incapazes de consentir, o que dificulta ainda mais a mensuração correta destes crimes sexuais. Ao todo, 75,5% das pessoas estupradas no país em 2021 eram vulneráveis.
Fonte: O tempo.