O setor de tecnologia gerou quase 18 mil empregos em Minas Gerais desde o início da pandemia, em março de 2020, e continua a se expandir — só no primeiro bimestre de 2022, foram novas 1.625 vagas ocupadas. O boom de oportunidades na área não tem data para acabar: o Brasil deve ter quase 673,5 mil novas vagas de 2022 até 2025, mas ainda tem dificuldade para preenchê-las, segundo a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais (Brasscom). De olho no filão, profissionais de outros setores se esforçam em fazer a transição para a área, que pode pagar em média três vezes e meia mais que o salário médio geral do brasileiro.
Formado em gestão de saúde, André Eleotério, 26, atuou por quatro anos na área e chegou a se especializar em epidemiologia e a trabalhar na Santa Casa de Belo Horizonte. Mas, de olho em um crescimento mais ágil na carreira, mudou o rumo profissional e entrou em uma nova graduação, desta vez em Ciência da Computação, em que rapidamente encontrou estágios com possibilidade de efetivação. “Na minha primeira graduação, o estágio era R$ 600, nessa é R$ 1.400 e negociando proposta de contratação. Hoje, avalio que a mudança foi a melhor decisão que tomei na vida. É uma área sem tanta distinção entre quem está na gestão de equipes e quem está com a mão na massa, na programação, então não tem tanta disparidade salarial quanto na área de saúde”, diz, hoje funcionário da mineira U4Cyrpto, startup de tecnologia.
O presidente do Sindicato da Indústria Digital de Minas Gerais (Sinfindor), Fábio Veras, explica que é habitual encontrar pessoas em transição de carreira nas empresas de tecnologia. “É comum a pessoa fazer uma formação técnica e mudar de carreira, exatamente pela qualidade da remuneração, o salário é muito superior. Hoje, 100% das empresas com que eu converso estão com vagas e dificuldade para preenchê-las. Falta investimento na formação, que é o mais estratégico para o desenvolvimento e a segurança estratégica do país”, analisa.
CEO do Órbi Conecta, organização que reúne negócios da área digital e de inovação em Minas Gerais, Dany Carvalho contabiliza que quase 3.000 pessoas com mais de 50 anos procuraram a edição mais recente de uma formação oferecida por instituições parceiras. “A faixa etária chama a atenção. Entraram não só pessoas que queriam começar a carreira na tecnologia, mas quem está migrando de carreira e pensa na área digital como uma oportunidade”, detalha.
Aos 63 anos, Alexandre Gouveia está no curso de Ciências de Computação e animado com o mercado de trabalho — ele poderia se aposentar no próximo ano, mas conta que pretende se manter trabalhando quando se formar. “Estou muito entusiasmado. Hoje, estou na área certa, escolhi a dedo”, diz. Ele trabalhou com tecnologia nos anos 90 e 2000. Com um diploma em administração, porém, afastou-se do setor.
Quem fez a transição há mais tempo também percebe que o mercado está mais aquecido. O programador Marcelo Vieira Valeriano, 42, migrou do setor financeiro para a tecnologia há 13 anos, depois de fazer um curso técnico. No começo, seu salário na área era menor do que o vale-refeição que recebia como analista de crédito, conta, mas, hoje, as propostas de emprego são constantes.
“Como faltam profissionais no mercado, o salário que oferecem para tirar o funcionário da empresa é alto, diariamente tem oferta. Empresas também contratam aulas com a minha para formarem profissionais do zero para o que elas precisam, porque não encontram pessoal na área”, conclui.
Diversidade é desafio para área de tecnologia — e afeta toda a sociedade
Os homens representam 61% da força de trabalho do setor de tecnologia brasileiro atualmente e estão ainda mais presentes nas funções técnicas e em cargos de diretoria e gerência, segundo levantamento da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais (Brasscom). Outras minorias sociais, como negros, pessoas LGBT e com deficiência, também são subrepresentadas na área, atestam nomes experientes do mercado.
“O talento não está só entre homens brancos, ele está em toda a nossa população, inclusive na mais carente, e precisa ser despertado. Por isso, precisamos lançar projetos de larga escala, porque isso naturalmente aumentará a diversidade do público que desenvolve tecnologia. Trazer a diversidade da nossa população para as equipes de desenvolvimento faz com que o produto final seja mais diverso”, defende o diretor de Inovação e Capital Humano da Brasscom, Sérgio Sgobbi.
A CEO do Órbi Conecta, Dany Carvalho, destaca que a exclusão de grupos minoritários nos cargos do setor resulta diretamente em aplicativos e outras tecnologias exclusivas. “Um dos impulsionadores da inovação é a diversidade. Se forem apenas pessoas jovens fazendo apps, qual será a usabilidade deles para pessoas de 50, 60 anos? Se forem só pessoas brancas, como pessoas negras, como eu, conseguirão utilizar um filtro de realidade aumentada no Instagram, se ele deixa meu rosto bege?”, questiona.
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