Entra ano e sai ano, o assunto mais discutido, e criticado, pela população de Matozinhos é a sem dúvida alguma a Poluição Atmosférica. Recentemente foi aprovada pela Câmara de Vereadores a instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito, denominada CPI do Pó Preto, para investigar e fiscalizar as ações referente ao tema. Neste sentido, e com o intuito de debater a pauta, o Vereador Sargento Martins fez um requerimento ao Poder Executivo para que fosse realizada uma Audiência Pública, que aconteceu na tarde desta quarta-feira (22) no Palácio da Cultura.
Autoridades municipais, estaduais, profissionais da área ambiental, representantes e funcionários de empresas, técnicos e consultores, além de uma pequena parcela da população participaram da sessão pública, que foi iniciada com as apresentações das quatro empresas de grande porte da cidade: BR Matozinhos, Cosimat, Fergubel e Cimento Campeão Alvorada CCA (antiga Lafarge).
As empresas tiveram 15 minutos para explicar o funcionamento das atividades, o processo realizado e as ações executadas para a minimizar o impacto ambiental.
Em seguida, Carlos Eduardo Godoy, sócio da empresa Teixeira e Godoy, que atua há anos na área ambiental, fez uma apresentação técnica e jurídica do assunto. “Se não eu fosse morador de Matozinhos iria achar que estava tudo bem, mas todos os dias na casa de quem mora aqui cai pó preto. Está tudo muito bem, mas porque isso acontece? Se está tudo muito bom de onde está vindo? Estamos falando do direito fundamental do ser humano que é a saúde. Não queremos que as empresas saiam do município, mas a responsabilidade é dos entes públicos: União, Estado e Município que, inclusive, tem o dever de fiscalizar quando o Estado se torna omisso”.
Para Godoy, o desenvolvimento do município é importante desde que seja responsável, sem desconsiderar a fala do povo. “O discurso é esse! Todo mundo está certo, mas o pó está aí. Queremos que as empresas se desenvolvam e gerem empregos, mas precisamos parar com essas apresentações bonitas e trazer a realidade nua e crua. A questão aqui é muito séria! Nós queremos que as empresas passem a atuar com compromisso e responsabilidade”, concluiu.
O Sr. Alceu Torres, Consultor da CCA e ex-Procurador do Ministério Público de Minas Gerais, explicou que, aparentemente, não é de interesse da Cimentos Nacional e das demais empresas negar as circunstâncias, mas é importante dimensionar e saber o quanto esse efeito existe, as chances que ele tem de ser corrigido e qual procedimento poderá ser feito. “Essa é uma questão muito técnica! A primeira ação, em 84 ou 85, foi da cidade de Cubatão e ela ainda nem chegou na fase de julgamento. Não existe juiz no mundo que vai ser capaz de dar uma sentença para resolver essa situação em lugar nenhum. A solução de problemas ambientais ela se dá primeiro com a participação dos órgãos competentes, autoridades públicas, no legislativo, com a construção de leis, com a participação das empresas, polícia ambiental e com o Ministério Público, que trabalha, sobretudo, na composição de danos. Todo lugar do mundo existe pó, em uns mais e em outros menos. Precisamos diminuir, é claro! A minha proposta aqui vai muito mais no sentido de se ter um olhar técnico da solução, construtivo, sem querer fazer um debate”, disse.
Os representantes da empresa Alger Consultoria e Assessoria Jurídica fizeram uma apresentação técnica muito interessante sobre a situação de Matozinhos, na tentativa de apresentar soluções técnicas que são resolvidas também com as avaliações concretas, em campo. “Nós preparamos uma apresentação técnica, sem trazer um decréscimo a economia local e tão pouco trazer desemprego. É possível fazer com criatividade e com conhecimento técnico. Fizemos um levantamento sobre os empreendimentos da localidade, através do geoprocessamento. De um lado as rodovias incrementam o desenvolvimento, mas podem também trazer poluição, com as ferrovias acontecem a mesma coisa, então temos que ser muito mais criterioso antes de “colocar o dedo na ferida” de alguém. O licenciamento nunca é uma autorização para poluir. A análise territorial não está presente em nenhum licenciamento do país, só em Minas Gerais, para que possamos ver se o empreendimento é mais ou menos impactante àquele território”, disse Germano Vieira.
Também representando a Alger Consultoria, a Dra. Zuleica, deu continuidade a apresentação. “Não dá para deixar de concluir que a análise tem que deixar de ser pontual e passar a ser território com todos as características do município, em busca do monitoramento integrado dessas fontes de poluição do ar”, explicou.
PRONUNCIAMENTO DOS INSCRITOS EM 3 MINUTOS
Houve um questionamento sobre o tempo dado aos inscritos para falarem sobre o assunto. Márcia Mansur (Engenheira Química), Fátima Mansur (Professora Aposentada) e Gerson (Professor) foram os únicos a darem suas opiniões.
Márcia questionou o Poder Executivo sobre a não existência da Secretaria de Meio Ambiente, o motivo que o Plano Diretor da cidade ainda não foi revisado, e deu ser relato como moradora. “Estive por três anos fora de Matozinhos e quando retornei a situação (pó) havia piorado”.
Fátima Mansur explicou que a situação da poluição em Matozinhos é muito antiga, inclusive citou a concessão dada pelo Poder Público para o funcionamento da antiga Usifer (onde hoje é o Mercado Municipal). “Tenho 43 anos de casada e antes já havia poluição. Esse assunto é muito antigo, e o povo está enfarado. E continuam errando pois foi dada autorização de funcionamento recentemente para uma indústria no Bom Jesus que polui o bairro todo. Eu estou doida? Ninguém polui nada não? De onde vem esse pó então?”, questionou.
Já o professor Gerson Carvalho lamentou os três minutos concedidos e frisou que é óbvio que o desenvolvimento econômico da cidade está atrelado ao desenvolvimento das indústrias. “Mas é factual que existe poluição, pois nós sentimos e enxergamos. É lamentável comparar Matozinhos a Cubatão nos dias de hoje. Espero que os poderes (Executivo e Legislativo) possam dar uma resposta ao cidadão sobre este assunto”.
A moradora de Matozinhos, Fabiana das Graças, foi a única inscrita no dia da audiência e pediu uma atenção especial dos poderes e das empresas para viabilizarem melhores condições nos preços de produtos e medicamentos que tenham relação direta à poluição. “Q ue possamos ter um preço mais acessível de material de limpeza, remédios gratuitos, pois várias pessoas estão adoecendo. A poluição prejudica muita gente e isso poderia ajudar de cerca forma”.
REPRESENTANTE DA SEMAD
A representante da Secretaria de Estado de Meio-Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Carolina, esclareceu que todos os empreendimentos em Matozinhos são licenciados com base em estudos e análise. “Essas condicionantes são monitoradas de tempo em tempo. Importante frisar que as fiscalizações são de competência do Estado de Minas Gerais”.
VEREADORES
Os únicos vereadores a se pronunciarem foram Carlos Henrique, Vereadora Jane Rosa e o autor do requerimento da Audiência Pública, Vereador Sargento Martins, que agradeceu a coragem dos que estiveram no palco colocando a “cara a tapa” e dando sua contribuição.
Questionado pelo Por Dentro de Tudo do motivo do requerimento da Audiência Pública se votou contrário a CPI do Pó Preto, o Vereador Martins, explicou: “Fui contrário a instalação de uma CPI porque tenho comigo que a utilização de meios inquisitoriais estão afetos ao Direito Penal e ao Processo Penal. Na verdade, quando fazemos esse uso, estamos atuando de forma imediatista sem pensar a longo prazo, ademais as medidas penais já foram adotadas pelo Ministério Público e que culminaram em vários termos de ajustes de conduta para ajudar a melhorar a qualidade do meio ambiente em nossa cidade. A opção, portanto, de realização de uma Audiência Pública se dá em face de que assim podemos disponibilizar a oportunidade de todos terem vez e voz na busca da construção da solução de forma que esta possa garantir a permanência das empresas em nossa cidade, garantindo a manutenção de emprego e renda e minimizando os impactos ambientais. Ademais, a solução de problemas passa pelo processo democrático que se consubstanciou na realização da audiência pública”.
Ao final das falas, o Presidente da Sessão, Indis Júnior, informou que será lavrada a ata da audiência e aprovada pelos representantes da mesa no prazo máximo de 15 dias.