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Serial killers: como a polícia de MG aprendeu a rastrear mentes criminosas

Por Dentro De Tudo:

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A execução de Pedro Rodrigues Filho, o Pedrinho Matador, considerado o mais violento assassino em série brasileiro e que dizia ter matado mais de 100 pessoas, trouxe à tona sua história e o desafio que representa para a polícia a identificação de criminosos do tipo. Morto no início do mês, o serial killer agiu durante cinco anos antes de ser preso, em meados da década de 1970, após fazer pelo menos 24 vítimas. Hoje, as técnicas de investigação avançaram, mas o intervalo de medo entre ondas de ataques e a prisão de psicopatas com esse perfil no Brasil ainda está distante do ideal, segundo a análise de especialistas.

 

Para um matador de múltiplas vítimas que não age regularmente – mata uma vez a cada ano ou de cinco em cinco anos, por exemplo –, as investigações e a prisão do autor não deveriam ultrapassar três meses. Mas a evolução dos processos de inteligência e apuração têm uma história pouco conhecida de trabalho árduo, que a reportagem do Estado de Minas detalha com fontes do setor. Investigações em Minas Gerais ilustram bem esses progressos, de acordo com analistas.

 

 

Maníaco do Industrial foi marco em apurações

Em fins da década de 2000 e início de 2010, o pavor levado à Grande BH pelos crimes de violência sexual contra mulheres, além de assassinatos e roubos depois atribuídos a Marcos Antunes Trigueiro, conhecido como o Maníaco do Industrial, hoje com 44 anos, duraram 315 dias, entre 17 de abril de 2009 e 26 de fevereiro de 2010. Preso desde então e condenado a 160 anos, ele cumpre a pena em ala separada do Presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, onde não há registro de outras agressões.

 

“O caso do Maníaco do Industrial foi diferente dos que se viram antes. Ocorreu uma verdadeira caçada e o alvo foi identificado como um assassino em série, que precisava ser parado imediatamente. Tanto, que quando foi divulgada a existência do matador, ele não atacou mais ninguém”, observa o coronel Carlos Júnior, especialista em inteligência de Estado e segurança pública, um dos oficiais que atuaram na Diretoria de Inteligência da Polícia Militar de Minas na época dos crimes.

 

“Mas 315 dias realmente é muito tempo para interromper os crimes e prender esse tipo de maníaco. Com a tecnologia e o treinamento que casos como esse trouxeram, uma resposta efetiva precisa ser dada com até 90 dias”, estima o especialista, referindo-se aos perfis de criminosos que atuam em curtos espaços de tempo.

 

De acordo com Carlos Júnior, o chefe da Agência Central da PMMG na época do Maníaco do Industrial, coronel Wilson Cardoso, estabeleceu em fins de 2009 o “alerta máximo”, que empenha todas as agências de inteligência da polícia, bem como a priorização dos trabalhos de campo junto a fontes, informantes e policiamento ostensivo. “Disso resultaram vários alertas operacionais para o policiamento preventivo, com foco naquele tipo de criminalidade (homicídios em série). A imprensa teve papel importante para ajudar a identificar e trazer denúncias, mas foi preciso antes pesar o risco de outras pessoas com uma psicopatia como a de Trigueiro, porém, ainda latentes, terem esse potencial aflorado e começarem a matar também”, afirma o coronel.

 

A primeira missão do coronel Júnior foi identificar se o autor das matanças e crimes sexuais poderia ser um agente treinado, com capacidade de agir de forma a despistar os investigadores. “É preciso separar as coisas, procurar identificar os métodos dos crimes, a composição de pistas deixadas. Descobrir se há alguém treinado em técnicas de inteligência ou de contrainteligência tentando apagar seus rastros ou criar distrações, caso fosse um policial, um militar de forças especiais ou agente treinado”, afirma.

 

Com as características dos crimes e as pistas filtradas de possíveis tentativas de encobrir rastros, um perfil do maníaco foi se moldando. As vítimas (veja quadro) eram mulheres com cabelos longos e pretos, independentes, proprietárias de veículos, que dirigiam sozinhas, sendo rendidas e obrigadas pelo agressor a seguir com ele para locais ermos.

 

Na sua maioria eram atacadas em horários comerciais (no intervalo de almoço no trabalho, muito cedo pela manhã ou à tarde), nunca de madrugada nem em fins de semana. Todas foram dominadas, sofreram abusos sexuais e foram estranguladas.

 

“Todas eram vítimas dos arredores da região do Bairro Industrial. Quando foram reunidas fotos de todas elas, percebeu-se uma grande semelhança. A região era densamente habitada e foi necessário um longo trabalho de análise manual de milhares de registros, desde ocorrências de homicídios, crimes sexuais a crimes de menor potencial que o assassino poderia ter cometido”, conta o coronel.

 

O trabalho também é integrado com os demais operadores de inteligência de Estado, como a Polícia Civil, o Ministério Público, a Superintendência Prisional e a própria Agência Integrada de Minas Gerais e seus acesso a órgãos da União, como a Polícia Federal. No caso do Maníaco do Industrial, o rastreamento dos celulares das vítimas foi o que possibilitou a prisão do autor, uma vez que ele vendeu dois aparelhos na mesma loja, o que o incriminou. Quando policiais foram à casa do criminoso, descobriram que a esposa dele tinha ganhado um dos outros aparelhos de uma das vítimas – sem saber da origem do telefone –, o que possibilitou a prisão.

Cinco anos de terror antes da prisão

O terror desencadeado com pelo menos 24 mortes entre as décadas de 1960 e 1970 pelo mineiro Pedro Rodrigues Filho, o Pedrinho Matador, natural de Santa Rita do Sapucaí, durou cinco anos – depois de preso ele teria matado, ainda, mais 47 detentos. Foi assassinado em 5 de março deste ano, em Mogi das Cruzes (SP), aos 68 anos, depois de ser solto em 2018, tendo cumprido 40 anos dos 128 a que tinha sido condenado. “Ele foi detido não pelo seu perfil de psicopata, mas como criminoso comum. Somente depois é que se percebeu se tratar de um justiceiro que matava quem na mente perturbada dele não merecia viver, por ser criminoso ou tendo sido julgado assim por seu senso distorcido de Justiça”, avalia um agente ligado à Diretoria de Inteligência da Polícia Militar de Minas, que não tem autorização para falar oficialmente sobre o assunto.

 

Onda de medo

As vítimas conhecidas do Maníaco do Industrial na Grande BH

 

 

17 de abril de 2009

» A.C.M.A., 27 anos

Encontrada morta, foi vítima de abuso sexual e estrangulada dentro do carro no Bairro João Pinheiro, Noroeste de BH. O filho de 1 ano e 1 mês foi deixado sobre o corpo

 

17 de setembro de 2009

» M.H.L.A., 49 anos

Corpo também com sinais de abuso sexual foi encontrado em seu carro no Conjunto Califórnia, Noroeste de BH. Foi estrangulada com o cinto de segurança

 

12 de novembro de 2009

» E.C.O.F., 35 anos

O corpo foi encontrado em estrada de terra do Bairro Jardim Canadá, em Nova Lima. Seu carro foi achado abandonado no Bairro Industrial, em Contagem. Foi vítima de abuso sexual e enforcada com o colar.

 

7 de janeiro de 2010

» A.F.P., 27 anos

Corpo encontrado dentro do carro no Barreiro de Baixo

 

7 de outubro de 2010

» N.C.A.P., 27 anos

Corpo encontrado em uma mata na região de Ribeirão das Neves. Foi enterrada como indigente. Quatro meses depois, exumação possibilitou o reconhecimento da vítima. 

 

 

Cerco fechado pela tecnologia

 

O investimento em tecnologia necessário para identificar perfis de criminosos não é barato, de acordo com o especialista em inteligência de Estado e segurança pública coronel Carlos Júnior. “Os equipamentos e sistemas usados para o rastreamento do Maníaco o Industrial chegaram a Minas Gerais depois de um investimento de R$ 50 milhões, mas só foram adquiridos após acordos diplomáticos e de cooperação no combate ao crime organizado transnacional e internacional, com os maiores fabricantes dessas tecnologias, como Israel e a Dinamarca”, afirma.

 

O especialista explica que é importante diferenciar as investigações, que estão a cargo da Polícia Civil e são referentes a fatos e alvos ou pessoas individualmente, enquanto a inteligência que é exercício da Polícia Militar, por exemplo, procura prever causas e consequências de crimes para evitá-los ou impedir que se repitam.

 

Uma das ferramentas usadas na inteligência para rastrear criminosos e que trazem bons resultados na identificação dos assassinos em série são os aparatos tecnológicos de extração de dados dos meios de comunicação da vítima (como telefone celular, tablet e notebook). A vítima pode ter se comunicado com o suspeito ou é possível mesmo que o criminoso tenha feito uso do aparelho, tornado possível a triangulação.

 

Os policiais dispõem também de sistemas de metadados. São programas que relacionam suspeitos e vítimas pelas características de cada caso, a linha temporal com os intervalos entre os ataques, as características dos métodos do criminoso, referência geográfica, turno em que estava ativo e situação das vítimas.

 

“É preciso também ter recursos humanos específicos. Na época, tínhamos um especialista em homicídios, mas nessa modalidade em geral. Seria preciso ampliar esse grau de especialização, para se ter um especialista em homicídios passionais, chacinas, execuções ligadas ao tráfico de drogas ou crimes em série mesmo, para se direcionar as ações com mais assertividade”, observa o coronel Carlos Júnior.

 

Programas de relacionamento de postagens e vestígios postados na internet pela vítima ou para ela também são vasculhados por ferramentas específicas. Os programas são capazes de realizar a análise de um grande volume de dados deixados no ambiente cibernético.

 

Vídeos

Outros instrumento são as câmeras. “A abrangência grande e crescente de câmeras em ambientes externos e internos é essencial atualmente. Tanto em edificações, nas ruas, quanto nas estradas, câmeras de segurança e controle auxiliam a construir rotinas e a flagrar atitudes de suspeitos ou vítimas. Em Minas Gerais há sistemas de identificação de placas de veículos em massa em grandes corredores e estradas, como o Helios, que auxiliam na identificação e rastreamento de criminosos que usam as vias rodoviárias”, afirma o coronel Carlos Júnior.

 

Com todo esse aparato, o rastreamento de criminosos em série se torna uma caçada cuja rapidez está longe do ideal, mas que tende a levar cada vez menos tempo. Uma agilidade indispensável, já que, nesse caso, a demora pode custar vidas. 

(foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press – 30/9/2010)

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