Produtos industrializados cada vez mais presentes no carrinho e na mesa concentram mais do que só açúcar, sal e gordura — trazem aditivos, texturas padronizadas e fórmulas que alteram a forma como o corpo responde à comida. Entender o que é um ultraprocessado e como identificá-lo no rótulo ajuda a evitar impactos que atingem desde o intestino até o cérebro.
O que são ultraprocessados
Na classificação NOVA, criada por pesquisadores da USP, ultraprocessados são os itens mais distantes do alimento em sua forma natural. Ou seja: quanto mais o produto depende de ingredientes e substâncias que não se usam na cozinha (emulsificantes, aromatizantes, espessantes, óleos modificados), maior a chance de ser ultraprocessado — e menor a fração de “comida de verdade” na composição.
Como reconhecer na prateleira
A melhor pista está na lista de ingredientes. Rótulos longos e com nomes técnicos — xarope de glicose, gordura vegetal hidrogenada, aromatizante idêntico ao natural, estabilizantes — indicam fortemente ultraprocessamento. Outros sinais práticos: produtos que duram semanas, textura e sabor muito padronizados, e sabores excessivamente doces ou salgados em comparação com versões caseiras. Um alerta simples: mais de cinco ingredientes, especialmente se muitos forem impronunciáveis, já é um sinal de atenção.
Os mecanismos que explicam os danos
Além das quantidades elevadas de açúcar, sal e gordura, ultraprocessados afetam o organismo por múltiplos caminhos interligados:
• Facilitam consumo excessivo — por serem macios, fáceis de mastigar e altamente palatáveis, reduzem a sensação de saciedade e favorecem o acúmulo calórico.
• Reforçam circuitos de recompensa — a combinação industrial de açúcar, gordura e aditivos provoca forte liberação de dopamina, estimulando a busca repetida pelo alimento mesmo sem fome.
• Desregulam hormônios de apetite — dietas ricas nesses produtos podem aumentar grelina (que estimula a fome) e reduzir hormônios que promovem saciedade, como GLP-1 e PYY.
• Afetam a barreira intestinal e aumentam inflamação — aditivos como emulsificantes podem alterar a camada de muco que protege o intestino, favorecendo a passagem de substâncias pró-inflamatórias para a circulação e desencadeando inflamação sistêmica.
• Podem expor a compostos nocivos — processos industriais podem gerar ou liberar substâncias como acrilamida e bisfenóis, que têm sido estudadas por potenciais riscos à saúde.
Essa inflamação de baixo grau e a desregulação metabólica também interferem no sistema nervoso, associando-se a maior sensibilidade ao estresse, irritabilidade e dificuldade de concentração.
Risco maior em crianças e adolescentes
Em fase de crescimento, cérebro e microbiota ainda se desenvolvem. Uma alimentação com predominância de ultraprocessados pode comprometer a formação de circuitos cerebrais e aumentar o risco de alterações de comportamento, sono, atenção e problemas metabólicos no futuro.
Nem tudo que parece “saudável” é inofensivo
Produtos com apelo saudável podem ser ultraprocessados: iogurtes “fit” cheios de aromatizantes e espessantes, barrinhas à base de xaropes e óleos refinados, pães de forma “integrais” com emulsificantes, leites vegetais industrializados e snacks embalados. Ler a lista de ingredientes é essencial.
Existe “quantidade segura”?
Não há um limite universal definido. A orientação prática é: reduzir ao máximo o consumo regular. Quando a base da dieta for composta por alimentos in natura, o organismo tende a tolerar consumos esporádicos; o problema é quando ultraprocessados viram rotina.
Como reduzir sem virar refém da cozinha
Mudanças graduais são mais sustentáveis. Algumas estratégias práticas:
• Preferir alimentos “quase prontos” (frutas, castanhas, iogurte natural, ovos) em vez de prontos industralizados;
• Preparar porções básicas para a semana (frango desfiado, legumes picados, arroz porcionado);
• Priorizar temperos frescos e receitas simples;
• Manter opções rápidas e naturais acessíveis;
• Ler rótulos antes da compra.
Planejamento e organização da casa tornam escolhas mais saudáveis automáticas — e menos uma obrigação.
Crédito da matéria: g1
Crédito da foto: Yasmin Castro/g1















