Uma pesquisa inédita revelou que apenas uma em cada quatro pessoas que foi internada com Covid se sente totalmente recuperada um ano após a alta hospitalar.
A sensação de recuperação total da doença é menor para as mulheres (32% menos provável), pessoas com obesidade (50% menos provável) e aqueles que tiveram que utilizar a ventilação mecânica durante o período de internação (58%).
Os dados são de um grande estudo pós-internação pela Covid (PHOSP-Covid, em inglês), conduzido no Reino Unido e publicado no último sábado (23) na revista especializada The Lancet Respiratory Medicine. Os resultados da pesquisa também foram apresentados no Congresso Europeu de Microbiologia Clínica e Doenças Infecciosas, que acontece em Lisboa (Portugal) de 23 a 26 de abril.
A pesquisa é liderada por Christopher Brightling, Rachel Evans e Louis Wain, professores do Centro de Pesquisa Biomédica do Instituto Nacional de Saúde, na Universidade de Leicester.
O estudo acompanhou 2.320 pacientes que tiveram alta hospitalar após uma infecção por coronavírus entre 7 de março de 2020 e 18 de abril de 2021. A primeira avaliação foi cinco meses após a alta hospitalar, enquanto a segunda foi feita um ano após a saída do hospital.
No momento de apresentação dos resultados, 807 participantes (33%) já haviam completado o tempo de acompanhamento de um ano. O estudo segue em andamento.
Com esses pacientes, os pesquisadores puderam ver que um quarto deles (205, ou 25,4%) estava totalmente recuperado um ano após a alta hospitalar. A avaliação de recuperação consistia em relatos do paciente combinados à análise do desempenho físico e à função dos órgãos vitais.
Os pesquisadores também colheram amostras de sangue para avaliar a presença de proteínas inflamatórias -alguns estudos já demonstraram que a presença de anticorpos contra o próprio organismo ou de marcadores de inflamação podem estar relacionados à Covid longa.
De acordo com as avaliações, os sintomas mais persistentes após um ano da alta hospitalar eram fadiga (60,1%), dores musculares (54,6%), perda de mobilidade (52,9%), problemas para dormir (52,3%), falta de ar (51,4%), confusão mental (46,7%), dores no corpo (46,6%) e perda de memória (44,6%). Inchaço (47,6%) e fraqueza nos membros (41,9%) também foram reportados, mas esses eram menores do que na avaliação com cinco meses (49,1% e 47,6%, respectivamente).
De acordo com a pesquisa, a proporção de pacientes que disseram ter se recuperado totalmente não mudou significativamente entre a primeira avaliação, de cinco meses (25,5%), e a segunda, de um ano (28,9%).
Para tentar elucidar os mecanismos por trás da Covid longa, os autores dividiram os pacientes em quatro grupos de acordo com a gravidade das sequelas da Covid: o primeiro grupo apresentava deficiência física e mental muito grave (319 pacientes ou 20%); o segundo, uma deficiência física e mental grave (493 ou 11%); o terceiro, deficiência física moderada com comprometimento cognitivo (179 ou 11%); e o quarto, uma deficiência física e mental leve (645 ou 39%).
Comparados com o grupo de deficiência moderada, os pacientes com deficiência física e mental muito grave tinham uma maior proporção de mulheres e pessoas obesas, indicando os dois fatores como preditivos para não se recuperar totalmente após um ano.
“Em nossa análise, estes dois fatores [obesidade e sexo feminino] também estavam associados a uma deficiência de saúde contínua mais grave, incluindo o baixo desempenho em exercícios e na qualidade de vida após um ano, o elucidando que esses grupos podem precisar de intervenções a longo prazo, como reabilitação”, diz o texto do artigo.
De acordo com os autores, a falta de medicamentos para tratar os efeitos da Covid longa ou de terapias específicas para tratar as sequelas apontam para uma necessidade de maior integração dos cuidados físicos e mentais.
“A gravidade e o comprometimento da saúde física e mental na Covid longa destaca a necessidade não apenas de uma estreita integração entre os cuidados com a saúde física e mental, incluindo avaliações e intervenções, mas também de trocas de conhecimento entre os profissionais da saúde para um melhor atendimento”, dizem.
“Nosso estudo enfatiza a necessidade urgente de serviços de saúde que apoiem essa grande e crescente população de pacientes que sofrem um peso expressivo dos sintomas um ano após a alta, incluindo a redução na habilidade motora e qualidade de vida. Sem tratamentos eficazes, a Covid longa pode se tornar uma nova condição de saúde de longo prazo com alta prevalência na sociedade”, concluem. (Folhapress)