Um estudo publicado recentemente na revista científica The Journal of Headache and Pain lança um alerta importante para quem sofre de enxaqueca crônica: o uso excessivo de analgésicos pode não apenas agravar as crises, mas também provocar alterações na estrutura do cérebro. A pesquisa, realizada com 63 mulheres na China, utilizou imagens de ressonância magnética multimodal e mostrou que o consumo frequente desses medicamentos pode estar associado à redução do volume de substâncias cerebrais responsáveis por funções essenciais como memória, regulação emocional, atenção visual e controle motor.
A enxaqueca, conhecida por provocar dores latejantes e intensas na cabeça, é muitas vezes acompanhada de náuseas, sensibilidade à luz e ao som, visão turva ou com pontos brilhantes, e, em alguns casos, dificuldades na fala e formigamento. Diante da intensidade dos sintomas, muitas pessoas recorrem com frequência a analgésicos como forma de alívio rápido. No entanto, segundo o estudo, essa prática pode desencadear um efeito contrário ao desejado: as crises se tornam mais frequentes e severas, caracterizando a chamada “cefaleia por uso excessivo de medicamentos”.
As imagens analisadas pela equipe científica revelaram mudanças especialmente significativas no giro para-hipocampal esquerdo, área ligada à memória e às emoções, e no giro occipital médio direito, responsável por processar estímulos visuais. Também foram observadas alterações no putâmen, uma estrutura cerebral relacionada ao aprendizado e ao controle motor, cuja atividade apresentou queda entre as participantes que utilizavam medicamentos em excesso. Além disso, houve redução na integridade da substância branca do cérebro, o que pode prejudicar a comunicação entre diferentes regiões cerebrais.
De acordo com o neurologista Tiago de Paula, membro da International Headache Society, o problema está justamente na tentativa de lidar com uma doença complexa por meio de soluções imediatistas. “Esses medicamentos não tratam a doença de forma efetiva. Quanto mais remédios, menos funcionam e mais dor o paciente sente. Isso se transforma num ciclo vicioso e prejudicial”, alerta o especialista. Ele destaca ainda que o uso indiscriminado de analgésicos torna o cérebro mais sensível à dor e modifica a forma como ele responde a estímulos comuns, dificultando o controle da enxaqueca a longo prazo.
O estudo reforça a necessidade de tratamentos mais eficazes, com acompanhamento médico adequado, que envolvam não apenas o uso de medicamentos específicos para prevenção das crises, mas também mudanças no estilo de vida, como melhora da qualidade do sono, redução do estresse e prática de atividade física. Para os cientistas responsáveis pela pesquisa, a descoberta abre caminho para novas abordagens terapêuticas e amplia o conhecimento sobre os impactos do uso prolongado de analgésicos na saúde cerebral.