Entre as casas do bairro Montreal, em Sete Lagoas, moradores que passaram a perder as noites de sono por medo e insegurança. Tudo começou depois de um grande vazamento de amônia no ar – substância tóxica que afeta a pele, olhos e as vias respiratórias – em maio de uma fábrica. Após soar o alarme da empresa, as pessoas, incluindo idosos com mobilidade reduzida, tiveram que deixar o entorno às pressas no fim da noite. E na última semana, o problema voltou a acontecer, agora durante a madrugada.
O empreendedor e mecânico industrial Fábio de Assis, 39, que vive a dois quarteirões da fábrica, tinha uma saúde de ferro, pelo menos até antes dos dois vazamentos. Ainda no primeiro registro, ele ficou com os olhos inchados, teve fortes dores de cabeça e precisou procurar o médico. Com a córnea comprometida pela amônia, a vítima já gastou quase R$ 2.000 no tratamento.
“Tem muita medicação e consultas. Foi algo muito forte, estava insuportável e aconteceu um pânico generalizado no bairro. Em um primeiro momento, achei que fosse dentro da minha casa, sai para o quintal e estava muito pior. Na hora, me deu uma sonolência, perdi a coordenação motora e tive uma queimação nas vias respiratórias”, conta.
Depois de visitas quase diárias ao oftalmologista, Fábio precisou tomar 12 injeções no corpo para acabar com a inflamação nos olhos, quando ocorreu o outro vazamento. “Nem recuperei do primeiro e já teve o outro. Ficamos numa situação vulnerável. O médico disse que corro risco de desenvolver uma catarata por conta da amônia”, acrescenta.
Tatiane Martins, 39, que já trabalhou na empresa, teve uma conjuntivite química por conta da substância tóxica. A desemprega até presenciou outro episódio interno de vazamento, porém o bairro não havia sido antigo na época. “Muita gente queimou o nariz, desmaiou lá dentro e ninguém disse nada. Agora, o vazamento está saindo para fora, é muito perigoso. Eu fiquei com o olho inflamado por dois dias”, disse.
Plantas e animais mortos
Já a aposentada Ângela Teixeira, 63, mora com a mãe, que tem problemas de saúde e muitas dificuldades para andar, em uma casa de frente à fábrica. Até a horta do quintal foi prejudicada pela amônia. “Essa última vez foi durante a madrugada, fizemos o maior sacrifício para sair de casa. O mau cheiro era terrível, provoca muita dificuldade para respirar. Muitas plantas da nossa hortinha morreram”, revela.
A vizinha, Rosileine Gonçalves, 42, reuniu os moradores para cobrar providências da fábrica. “Custaram a nós receber e não souberam informar bem o que aconteceu. Parece que uma bomba de refrigeração estourou e a amônia invadiu o bairro todo. Tiveram três pessoas que desmaiaram na avenida e muita gente ainda sente dificuldade para respirar, mesmo depois de uma semana”, afirma.
É o caso da aposentada Maria Tereza de Jesus, 70. Ela tem bronquite e diabetes e viu a situação de saúde piorar após o incidente. “Mesmo a gente colocando pano na janela molhado, no rosto, prejudica. Se continuar assim, vai acabar com a nossa vida. Tenho só essa casa, não tenho outra”, relata.
Até a pequena Bianca Nunes, 8, ficou assustada e passou mal em casa, onde também estava o priminho, de apenas um mês. “Eu tava me sentindo muito mal, eu ouvi minha mãe e meu pai conversando, e o alarme tocando. Quando eu fui descer, estava com um cheiro muito forte, eu não sabia direito o que era”, narra. A menina teve ainda tonteira e muito medo. “Fiquei preocupada com o meu priminho, que é pequeninho, de um mês. Isso é muito perigoso, quando a minha tia passou de carro perto da fábrica tinha uma mulher desmaiada”, finaliza.
Problema no sistema de refrigeração
Em nota, a Vibra informou que já vem “conversando com moradores do bairro Montreal para ouvi-los e para esclarecer os incidentes, ocorridos em 16 de maio e 9 de julho”. Conforme a empresa, está em andamento uma investigação técnica “envolvendo profissionais da equipe interna e especialistas de renome no mercado, para elucidar as causas do incidente, ocasionado pela variação de pressão na rede de um sistema de refrigeração”.
A companhia alegou ainda que possui as licenças ambientais e operacionais em dia, além de sistema de segurança, alarme e plano de evacuação da unidade. Já a Prefeitura de Sete Lagoas disse que a fiscalização é de responsabilidade do Estado. Segundo o Executivo municipal, foi instaurado um inquérito pela Polícia Civil e acionado o Núcleo Emergencial da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
A perícia compareceu à empresa na última terça-feira (14), para realizar as análises. De acordo com a Polícia Civil, uma das válvulas da fábrica de proteína animal apresentou defeito e, por duas vezes, fez a amônia dispersar no ar. Os investigadores colheram uma amostra da substância e ainda verificaram o equipamento para avaliar se houve crime ambiental.
Com informações: O Tempo.