Mulheres que são vítimas de violência doméstica durante o climatério apresentam uma maior prevalência de dor pélvica, disfunções sexuais e sintomas de estresse pós-traumático do que aquelas que não têm histórico de agressões, conforme um estudo realizado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). A pesquisa, intitulada “Sexualidade e Saúde Mental da Mulher Climatérica Vítima de Violência Doméstica”, avaliou 100 mulheres entre 40 e 65 anos, divididas em dois grupos: um com vítimas de agressões e outro com participantes sem histórico de abuso. Mulheres que estavam em uso ativo de substâncias ilícitas, alcoolistas, com quadros psicóticos, com comorbidades físicas graves diagnosticadas ou com histórico de outros tipos de violência foram excluídas do estudo.
Os resultados revelaram que as vítimas de violência doméstica apresentaram índices significativamente mais altos de dor pélvica (82% contra 26% no grupo controle), incontinência urinária (58% contra 26%), endometriose (28% contra 10%), infecções ginecológicas (32% contra 10%) e vaginismo (42% contra 6%). O vaginismo é caracterizado pela contração involuntária da musculatura vaginal, dificultando ou impedindo a relação sexual.
A violência doméstica é um problema global que afeta uma em cada três mulheres, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), e deixa marcas duradouras na vida das vítimas. O climatério, que é o período de transição entre a vida reprodutiva e a não reprodutiva, pode durar vários anos e envolve mudanças hormonais graduais. Durante esse período, as mulheres podem enfrentar irregularidades menstruais, ondas de calor, alterações de humor, ganho de peso, insônia e redução da libido, entre outros sintomas. A menopausa, que é a última menstruação da mulher, ocorre em média entre 45 e 55 anos.
Os dados da pesquisa evidenciam que os abusos causam impactos duradouros no corpo feminino, afetando a saúde reprodutiva, a saúde mental e a qualidade de vida. As vítimas de violência demonstraram uma maior prevalência de transtornos psicopatológicos e de estresse pós-traumático, indicando que os efeitos das agressões vão além do aspecto emocional e impactam diretamente o bem-estar sexual e ginecológico. O desconforto sexual foi quase duas vezes mais comum entre as mulheres vítimas de violência, com 76% enfrentando essa questão, em comparação a 46% do grupo controle.
Além disso, o estudo identificou uma maior prevalência de doenças crônicas associadas ao estresse, como diabetes, que foi nove vezes mais comum entre as vítimas (18% contra 2%), e hipertensão arterial, que foi quase duas vezes maior entre as vítimas (54% contra 32%). A pesquisa revelou que os tipos de violência vivenciados ao longo da vida pelas participantes foram: 74% de violência física, 66% de violência sexual e 80% de violência psicológica. A maioria das agressões ocorreu na vida adulta (76%) e, em 90% dos casos, os episódios foram recorrentes, evidenciando a natureza repetitiva e cumulativa da violência doméstica. Quase metade das vítimas (48%) relatou ter sido agredida por familiares.
A pesquisa foi conduzida pela pesquisadora Débora Krakauer, que enfatizou a necessidade de um atendimento multidisciplinar às mulheres em situação de violência, integrando profissionais da saúde física e mental. Krakauer destacou que a violência doméstica compromete a integridade psicossomática da mulher, exigindo abordagens que considerem corpo, mente e contexto social. O professor José Maria Soares Júnior, coordenador do estudo, complementou que a violência deixa marcas que não são apenas emocionais, mas também físicas, como dores crônicas e disfunções sexuais, ressaltando a importância de os profissionais estarem preparados para identificar esses sinais e oferecer um cuidado integral.
O estudo faz parte do Programa de Pós-Graduação em Obstetrícia e Ginecologia da FMUSP e foi realizado com a aprovação dos comitês de ética do Hospital das Clínicas e do Centro de Saúde Escola Geraldo Paula Souza.
Crédito da foto: Reprodução/EPTV
Fonte: g1.globo.com