Violência sexual acomete 1,8 milhão de homens

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No Brasil, cerca de 1,8 milhão de homens declaram ter sofrido violência sexualem algum momento da vida, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É uma minoria, em comparação ao número de mulheres que sofrem essa violência. Como no caso delas, a maior parte dos agressores também é homem. E, com o peso do machismo e de estereótipos de gênero, homens que foram violentados podem esconder por décadas o que sofreram. 

O relato da vergonha se repete nos atendimentos do projeto “Memórias Masculinas”, que presta apoio psicológico a homens adultos que sofreram violência sexual em qualquer momento da vida. Gratuito e online, ele dá acesso a terapeutas especializados no tema para atendimentos em momentos de crise emocional.

“Majoritariamente, os homens que atendemos foram vítimas de violência sexual na infância, mas também há uma grande porcentagem, 34%, que foram vítimas na adolescência. A maioria dos homens que atendemos é heterossexual e faz sexo com mulheres, mas as violências são majoritariamente cometidas por outros homens. É grande o medo das vítimas de que isso os ‘torne gays’, como se a violência pudesse provocar isso. Isso faz com que os homens vítimas de outros homens falem muito menos sobre o assunto”, detalha o idealizador do projeto, o psicólogo Denis Ferreira.

Os casos de violência sexual contra homens entre 2010 e 2021 são 12,1% do total de registros do Ministério da Saúde. Só nesse período, 43,2 mil casos foram notificados oficialmente — quase 5.000 em Minas Gerais. Na infância, entre os 5 e 9 anos, a porcentagem de meninos e meninas que sofrem violência sexual é similar, de acordo com análise da Unicef com o Fórum Nacional de Segurança Pública, e vai se distanciando nas faixas etárias mais velhas, com uma proporção muito superior de mulheres. Pesquisadores reconhecem que, de fato, elas são mais afetadas, porém a proporção de homens vitimados pode ser muito maior do que as estatísticas demonstram. 

“Quanto mais velho, menos o menino tende a revelar que sofreu violência sexual. Isso porque, quanto mais velho, mais se percebe os estereótipos de gênero e mais a pessoa tenta se comportar de acordo com ele. O papel de gênero masculino gira em torno de características que remetem à força, e há certa incongruência com isso quando o menino se percebe vítima de violência sexual. Não é que não se sinta amedrontado e triste com o que ocorreu, mas ele percebe que esse papel de vítima não é aceito”, analisa o professor de psicologia da Instituto de Medicina, Estudos e Desenvolvimento (Imed) de Passos, no Rio de Grande do Sul, Jean Von Hohendorff, especialista no tema. 

Educação sobre gênero é fator de prevenção da violência sexual, diz pesquisador

Para Von Hohendorff, a redução de casos de violência sexual passa pela educação sobre estereótipos de gênero desde cedo, para que homens não encarem mulheres como objetos a ser conquistados ou pensem que não podem demonstrar vulnerabilidade. Ao mesmo tempo, ele defende tratamento para os agressores. 

“Precisamos transpor essa ideia de que basta que eles sejam responsabilizados formalmente. Eles precisam ser, mas precisamos dar um passo além, a responsabilização. É preciso oferecer tratamento efetivo para esses agressores para que eles reconheçam a inadequação do que fizeram e tenham alternativa de lidar com o eventual desejo sexual inadequado que não seja cometendo violência”, diz. 

Ele também reforça que é essencial os adultos transmitirem segurança às crianças e adolescentes para reduzir o silêncio sobre a violência sexual contra meninos. “Precisamos instrumentalizar os adultos para proteger as crianças, porque não cabe a elas se autoproteger. O adulto pode dizer à criança que quer que ela saiba que pode contar com ele para qualquer coisa que aconteça, por mais que a criança tenha medo, vergonha ou que alguém tenha pedido segredo, porque estará lá para ajudar. Essa palavra, ‘segredo’, é importante, porque os agressores geralmente são da família. É preciso fomentar canais abertos de diálogo com a criança, e não só aquele diálogo de repressão, de xingamento”, conclui.

Fonte: O Tempo.

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