Uma funcionária de uma escola de Belo Horizonte acionou a Justiça e conseguiu o direito à redução da jornada de trabalho, sem redução no salário, para cuidar do filho com autismo, de 3 anos. A decisão é da Oitava Turma do TRT-MG (Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais), que mantiveram sentença proferida da 47ª Vara do Trabalho da capital, e ainda cabe recurso da decisão.
A auxiliar de apoio ao educando foi contratada em outubro de 2019 para exercer a função com carga de trabalho semanal de 44 horas, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira. A unidade educacional fica no bairro Tirol, na região do Barreiro.
No processo, ela contou no processo que é mãe de três filhos: duas meninas, uma de 17 e a outra de 10 anos, e um menino de 3 anos. Em julho de 2021, após consulta com um neurologista e uma psiquiatra, foi constatado que o filho tem autismo.
Desde então, a criança faz uso de medicamentos e precisa do auxílio da mãe para realizar as atividades propostas para o desenvolvimento. Afirmando ser impossível garantir esse apoio trabalhando 44 horas por semana, a profissional ajuizou ação trabalhista pedindo a redução da carga horária no emprego sem redução salarial.
O juízo da 47ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte concedeu a redução da jornada à funcionária, julgando parcialmente procedentes os pedidos dela. Pela decisão, ela deverá cumprir jornada das 7h às 13h15min, com 15 minutos de intervalo para refeição e descanso, sem redução do salário ou compensação de horários.
Recurso negado
De acordo com o TRT-MG, a empresa recorreu da decisão, alegando ser uma empresa pública estadual integrante da administração pública do estado de Minas Gerais. Por isso, segundo a defesa, é descabida a aplicação de lei que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, já que ela é regida pelas normas da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
A defesa ainda argumentou que a trabalhadora não apresentou prova de que o menor necessita de determinadas terapias, de tratamentos e de acompanhante.
No entanto, os julgadores da Oitava Turma do TRT-MG deram razão à profissional. Segundo o desembargador relator Marcelo Lamego Pertence, a documentação anexada ao processo atesta que a criança apresenta “quadro clínico compatível com CID 10 F84 [transtorno global de desenvolvimento – espectro autista]” e “necessita do auxílio da mãe”.
Ainda segundo o TRT-MG, um relatório fonoaudiológico de outubro de 2021 aponta que o menino iniciou o tratamento na área por apresentar atraso de fala, com acompanhamento todas as quintas-feiras, das 17h30 às 18h.
Já o parecer emitido pela psicóloga a serviço da Secretaria Municipal de Saúde de Ibirité mostrou que a criança é acompanhada por equipe multidisciplinar (terapia ocupacional, psicologia e psiquiatria) no Caps-1 e necessita de acompanhamento semanal com os profissionais, sem previsão de alta.
Decisão
O desembargador Marcelo Lamego Pertence reconheceu que o pleito de redução de carga horária para tratamento de filho com necessidades especiais não encontra expressa previsão na CLT ou nos instrumentos coletivos aplicáveis ao caso. Por outro lado, ele magistrado destacou que, pelo artigo 227 da Constituição, constitui dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem o direito à vida, à saúde e à dignidade.
“Isso além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência ou discriminação, incumbindo ao Estado a criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas com deficiência física, sensorial ou mental, inclusive com a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos”, escreveu o relator.
Ele também destacou a Lei 13146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência), que assegura “que a pessoa com deficiência possa gozar ou exercer, em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos e liberdades fundamentais”.
No processo, o magistrado ainda reforçou que a Lei 12764/2012 (Política Nacional de Proteção da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista) estabelece que a pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.
Por isso, o desembargador considerou a adaptação razoável da jornada da trabalhadora aplicável ao caso. “Tudo para assegurar ao menor deficiente o tratamento necessário ao seu desenvolvimento e cuidados com a saúde, o que exige o acompanhamento da genitora”, determinou.
O julgador manteve então a condenação da funcionária para reduzir a duração semanal de trabalho de 44 para 30 horas, com trabalho de seis horas diárias, de segunda a sexta-feira.
Com TRT-MG
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